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Leonardo Sakamoto

Fiscalização localiza dono de confecção que tentou vender escravos no Brás

Leonardo Sakamoto

17/02/2014 21h02

Fiscalização, realizada nesta segunda (17), localizou o dono de uma oficina de costura que, na semana passada, tentou vender dois trabalhadores imigrantes como escravos no Brás, na região central de São Paulo. O proprietário da confecção em questão admitiu ao Grupo Especial de Fiscalização Móvel ter pago a passagem de ambos e mais um terceiro, e afirmou que os apresentou na capital para tentar "ajudá-los" a conseguir outro emprego. A matéria é de Igor Ojeda, da Repórter Brasil:

Ele foi localizado durante fiscalização conjunta realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, Ministério Público do Trabalho, Defensoria Pública da União e Polícia Federal, acompanhada pela Repórter Brasil.  Para a equipe de fiscalização que acompanhou a ação, o proprietário da oficina pretendia, ao tentar comercializar os dois trabalhadores, reaver o que gastou com as passagens de ambos. Os trabalhadores são bolivianos, e entraram no país pelo Paraguai. A transferência para o pagamento das passagens foi feita via Western Union, conforme revela comprovante de envio encontrado pela fiscalização.

Endividados ao chegar ao Brasil, eles teriam que trabalhar para pagar o valor da passagem, o que configurou servidão por dívida. Além de trabalho escravo contemporâneo, também foi caracterizado tráfico de pessoas.  De acordo com os auditores fiscais Renato Bignami e Luís Alexandre Faria, o consulado da Bolívia intercedeu e os dois trabalhadores já regressaram à Bolívia. O terceiro não foi localização. O MTE pretende localizá-los para garantir o pagamento de verbas rescisórias e o salário referente ao período em que permaneceram no país.

O proprietário da oficina em questão pode sofrer um processo criminal. O MTE pretende encaminhar toda documentação relativa ao caso para o Ministério Público Federal e para a Polícia Federal para que as medidas cabíveis na esfera criminal sejam tomadas.

Responsabilidade – A oficina em questão produzia para a empresa Atmosfera Gestão e Higienização de Têxteis, que foi considerada responsável pela situação a que os três bolivianos foram submetidos. Além do episódio da venda de trabalhadores em que foi configurada escravidão e tráfico de pessoas, a fiscalização também constatou que dois adolescentes trabalhavam na produção das peças. Para assegurar os direitos de ambos, o Conselho Tutelar de Cabreúva foi acionado e ficou de informar o Ministério Público Estadual.

A Atmosfera se apresenta como líder no mercado de gestão e higienização de têxteis, atendendo indústrias, hospitais e hotéis. O grupo, que foi adquirido recentemente pela empresa francesa Elis, uma das maiores do mundo no setor, informa em sua página na internet ter mais de três mil clientes e operar na Bahia, Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Rio de Janeiro. A Repórter Brasil tentou contato com os representantes da empresa no começo da noite desta segunda, sem sucesso.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.