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Leonardo Sakamoto

Você não é um troll? Então, participe do concurso "O Comentário de Ouro"

Leonardo Sakamoto

26/02/2014 12h56

A interpretação de texto não é o forte na internet. Você se esforça para dizer que o "céu é azul" e a outra pessoa leitor entende que a "morsa está gripada".

Explica que "a água é poluída" e ele ou ela reclama que você esta defendendo "um abraço em um zumbi fedorento".

Por isso, este blog volta com o concurso: "O Comentário de Ouro da Internet", que vai premiar o comentário mais civilizado e construtivo sobre temas que estão na boca do povo.

A regra é simples: o comentário deve conter, pelo menos, três das dez palavras e expressões abaixo. Elas foram sugeridas – sem nenhuma segunda intenção aparente – por amigos jornalistas de redações em São Paulo, em 2013, e atualizadas este ano. Eles aproveitam para dedicar sua participação nesta importante iniciativa educacional às professoras que lhes mostraram que aprender a ler é ir muito além da vovó que viu uma uva.

Este mesmo grupelho anônimo vai indicar o melhor comentário, que consiga passar uma mensagem a) sem ofender ninguém, b) não usar lugares-comuns, c) evitar achismos e d) que tenha começo, meio e fim.

O melhor comentário ganhará uma versão de bolso do "Manifesto Comunista", para você levar à praia, ao campo, à balada, a todos os lugares.

Não, isso não é uma piada. É sério. E será enviado pelo correio, como já enviei outros livros de ganhadores de concursos promovidos pelo blog. Com Marx não se brinca.

O concurso "O Comentário de Ouro" se encerra na nesta sexta (28).

Seguem as palavras e expressões, escolhidos sem nenhuma pretensão em causar polêmica:

Médicos cubanos
Black Blocs
Homem de bem
Torcida organizada
Gay tem que apanhar
Aborto 
Maioridade penal
Amarrar no poste
Vadia
Pena de morte

Gosto de voltar a esse tema porque ele é fundamental. Se não aprendermos a nos comunicar – e rápido – toda essa riqueza de posições e opiniões, diferenças e vivências, na rede vai se perder naquele canto quentinho que é o maniqueísmo. Estamos passando pela adolescência da internet, as pessoas estão conhecendo o outro. Mas temos que sobreviver a essa adolescência.

Ao mesmo tempo, não acho que a interpretação de texto morreu com a internet. Também não sei se é possível cravar que estamos mais desatentos, superficiais ou incapazes de nos focar. Na verdade, nunca se entendeu muita coisa mesmo.

Só que, antes, os textos não tinham área de comentários. E como apenas meia dúzia de pessoas contava com tempo e paciência para mandar cartas, os jornalistas pensavam que estava tudo OK.

É claro que, com a internet, as pessoas estão escrevendo para seus próprios grupos, dentro de seus próprios campos simbólicos. Se conseguirmos atuar na filtragem e tradução de determinadas informações hipercodificadas de e para esses grupos, teremos a beleza de conseguir democratizar mais conhecimento.

Diariamente ajudamos a forjar símbolos coletivos que valem para uma grande gama de pessoas de Norte a Sul do país.

A tristeza é que, se você quiser falar de "popozudas" será bem mais fácil do que discutir consumismo e discriminação de gênero.

Há algumas palavras-chave que ativam uma área violenta e primitiva do cérebro de algumas pessoas. Quando surgem, elas ignoram totalmente o contexto em que as palavras estáo inseridas, deixam de lado a necessária ponderação presente nos ambientes de diálogos construtivos e soltam Cérbero, o cão que guarda a porta do Tártaro, para cima do insolente que ousou dizer tal heresia. Abandonam o texto, em verdade.

Não tenho nenhuma ilusão de que um texto compartilhado milhares de vezes foi efetivamente lido pelo mesmo número de pessoas. Ou seja, sabe o que um texto bem compartilhado significa? Tudo. E nada.

Aguardo seus comentários aqui neste espaço abaixo.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.