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Leonardo Sakamoto

Em nome de uma sociedade mais plural, Entreviste uma Mulher

Leonardo Sakamoto

21/08/2014 21h57

Não existe imparcialidade jornalística. Qualquer estudante de jornalismo aprende isso nas primeiras aulas. Quando você escolhe um entrevistado e não outro está fazendo uma opção, racional ou não, por isso a importância de ouvir a maior diversidade de fontes possível sobre determinado tema. E essa diversidade, que já é pequena nas redações convencionais ou alternativas, progressistas ou conservadoras, é menor ainda quando se diz respeito ao gênero. Sim, mulheres são pouco ouvidas. E isso acaba distorcendo a forma através da qual a sociedade entende a si mesma.

Para tentar ajudar a mudar essa realidade, a Olga, uma organização que se dedica a elevar o nível de discussão sobre a feminilidade hoje, lançou o projeto "Entreviste uma Mulher", que pretende aumentar o número de mulheres entre as pessoas entrevistadas sobre os mais diferentes temas. Para isso, está montando um grande banco de dados público que pode ser acessado por jornalistas ou qualquer pessoa interessada em diversificar suas fontes de informação.

De acordo com Juliana de Faria, uma das coordenadoras do Olga, existe uma ausência de fala feminina na mídia. "E os motivos são vários. Vai desde a falta de mulheres na liderança até a baixa participação em profissões ditas masculinas, como engenharia, mas todas essas justificativas ainda permeiam o sexismo".

Segundo ela explicou a este blog, "isso é problemático para o jornalismo, que pode acabar trazendo debates empobrecidos ou enviesados, e para a democracia também. E nosso projeto não quer que homens não sejam mais entrevistados. A proposta aqui é auxiliar comunicadores a se conectar com fontes com que normalmente não falariam, justamente para promover a diversidade".

O Olga também foi responsável pela campanha "Chega de Fiu Fiu", que pautou o debate sobre o assédio sexual travestido de cantada "inofensiva" em locais públicos. A campanha se baseou em uma reveladora pesquisa produzida pela Olga junto a mulheres pela internet.

Ilustração: Leah Goren

Ilustração: Leah Goren

Abaixo, mais informações sobre o "Entreviste uma Mulher" retirado do site do Olga:

Seja de direita ou de esquerda, você hoje encontra milhares de colunistas, fontes e colaboradores em jornais, revistas, TV e internet para ajudar você a entender o mundo e formar a própria opinião. Existem vários grupos de minorias, no entanto, que têm relativamente poucos representantes. Um deles são as mulheres. Em 2013, a Universidade de Nevada pesquisou 352 matérias de primeira página do jornal The New York Times e viu que, dentre os entrevistados, 65% eram homens e apenas 19% eram mulheres (17% se referiam a fontes institucionais). No Brasil, a Superinteressante abordou o tema em 2010 e revelou que apenas 25% das fontes eram mulheres.

No jornalismo, essa ausência de fala feminina traz muitos problemas para a sociedade e para a democracia. O debate em assuntos de interesse especial às mulheres — como o aborto, por exemplo — ficam empobrecidos ou enviesados. Basta ver a reação recente à questão do assédio sexual em locais públicos: homens no spotlight da mídia se davam ao direito de opinar também sobre a dor que as mulheres sofriam, porque estão acostumados a ser os únicos a opinar sobre tudo. É necessário que a mídia busque a diversidade, incluindo as mais diferentes perspectivas e pontos de vista, para criar reportagens e análises mais ricas e complexas. E isso não será atingido se as opiniões de metade da população não forem levadas em conta.

Há vários motivos para essa baixa presença feminina nas notícias. Faltam mulheres em algumas áreas (como as engenharias, por exemplo). Há também um gap de gênero em posições de liderança: sejam colunistas, blogueiros, CEOs e diretores de empresas, ainda há um enorme território a ser conquistado pelas mulheres. Mas, apesar desses desequilíbrios de gênero existirem, sim, não precisamos perpetuá-los.

Queremos ajudar a mudar esse cenário. E, para isso, estamos lançando o projeto Entreviste Uma Mulher, que se propõe a encontrar essas mulheres e conectá-las aos jornalistas.

Publicamos aqui um documento com os contatos de mulheres inspiradoras, com trabalhos relevantes em suas áreas, que podem ser fontes em matérias, auxiliar em pesquisas, participar de debates e palestras. Atenção: não estamos dizendo que homens não devem ser entrevistados, nem que só as mulheres têm a palavra final sobre os assuntos a serem discutidos. O que propomos aqui aos responsáveis pelos veículos de comunicação é que prezem pela a diversidade ao elaborar suas pautas.

Quer procurar uma fonte? – Editores, repórteres, produtores de TV e promotores de eventos podem procurar um profissional que se encaixa em sua pauta — disponibilizamos uma mini biografia e suas áreas de conhecimento — e entrar em contato diretamente com as participantes. O documento está organizado em ordem alfabética. Então sugerimos que realize a procura (ctrl + F) por uma palavra-chave.Aceitar ou não o convite fica a cargo delas, claro.

Quer ser uma fonte? – Qualquer mulher pode fazer parte do projeto. Envie uma mini bio (no máximo, 4 linhas), as áreas de seu expertise, exemplos do seu trabalho (links, estudos, sites, páginas no Facebook), a cidade onde vive e seu contato (não se esqueça do DDD) para o e-mail juliana@thinkolga.com com o título Entreviste Uma Mulher. Também é permitido indicar outras mulheres, desde que com o devido consentimento. Todos os perfis serão submetidos a análise.

Para acessar o "Entreviste uma Mulher", clique aqui.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.