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Leonardo Sakamoto

Dá para torcer pelo (glorioso) Palmeiras e o Corinthians ao mesmo tempo?

Leonardo Sakamoto

15/09/2014 13h05

Dá para torcer pelo glorioso Palmeiras e o Corinthians ao mesmo tempo? Pois é o que fazem grandes doadores de campanha que colocam recursos em muitos cavalos ao mesmo tempo, mesmo cavalos concorrentes. Dizem que querem promover a democracia com isso. Ahã, Claudia, senta lá.

Por mais que o programas de governo dos principais candidatos sejam cada vez mais parecidos (muito por conta da falta de propostas detalhadas), ainda assim é muita cara de pau de doadores apostarem em todos os números da roleta para, sempre, sair vencedor. Passei algumas horas verificando os dados de doações para diferentes cargos e é um faz-me-rir atrás do outro.

Teoricamente, o ato de doação é um indício de que o doador comunga das propostas do candidato, deseja que ele o represente politicamente, seja por suas ideias, seja por sua classe social ou quer criar com ele um vínculo por meio desse apoio em campanha. Alguns eleitos mantém apenas diálogos cordiais com os financiadores (do tipo, "obrigado, mas fiquemos a uma distância de segurança para não pegar sapinho"), outros literalmente "pagam" através de serviços prestados.

Mas não é um pagamento retroativo, mas um pensando em garantir a continuidade do financiamento na próxima eleição.

Sugestão, se me permitirem radicalizar: tornar mais transparente a participação de doadores de campanha em licitações públicas. No mínimo, que o cidadão seja informado disso.

Adoraria, por exemplo, ver naquelas placas de obras, logo abaixo do valor do contrato, a frase:

"Empresa doadora de campanha que elegeu o(a) atual presidente(a)".

Ou, que ficasse carimbado nos projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional e nos quais verifica-se conflito de interesses, o aviso:

"Projeto elaborado por parlamentar financiado por bancos/empreiteiras/empresas agropecuárias."

A informação é aberta, via Tribunal Superior Eleitoral. Basta aprovar uma leizinha.

Note que não estou falando de impedir contratos com financiadores de campanha (o que seria uótemo), mas pedindo mais instrumentos de transparência.

Há também aqueles candidatos, de diferentes partidos, de progressistas a conservadores, que não aceitam doações de pessoas jurídicas. São os chamados "idiotas". Pois não teriam percebido que o mundo é outro e não se faz política sem muito dinheiro e sem empresas fluindo rios de recursos. Mas a verdade é que o mundo é outro porque nós permitimos que as eleições se tornassem uma grande mesa de fundos de investimentos futuros.

Estou ansioso para ver como serão as próximas eleições com as limitações para doações de pessoas jurídicas.

A ladainha é antiga, mas ou viramos o jogo, o que inclui uma discussão mais séria sobre financiamento de campanha ou continuará sendo muito difícil encontrar alguém que ganhou uma eleição sem compromissos a serem quitados neste país.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.