Topo

Leonardo Sakamoto

Enquete: Comentários na rede contribuem para manutenção de preconceitos

Leonardo Sakamoto

26/12/2014 11h42

Os comentários em textos e posts na internet são dispensáveis e não mudam a opinião. Pelo menos é o que apontou uma enquete sem critério científico algum que lancei, há uma semana, neste blog. A maioria dos leitores que respondeu acredita que comentários que incitam o ódio devem ser moderados, ao passo que os que contrariam a opinião do autor do texto precisam ser mantidos.

Essa pesquisa já havia sido aplicada junto aos leitores no ano passado, com resultados bem semelhantes (veja os números ao final). Mas cresceu a quantidade dos que avaliam os comentários como mais conservadores em comparação ao que pensa o restante da sociedade (de 48,38% para 54,83%) e dos que consideram que eles contribuem para o acirramento de ânimos e a manutenção de preconceitos: (de 57,55% para 67,47%) – o que pode ser sintoma da polarização eleitoral que transformou a internet em ringue de luta no gel este ano.

A maior parte dos que opinaram não publicam comentários e, dentre os que publicam, a maior parte usa perfil do Twitter ou do Facebook. A internet também levou os que responderam a enquete a participarem de debates, uma vez que nunca haviam enviado cartas para jornais e revistas antes de usarem a rede. A pergunta mais respondida este ano teve cerca de dois mil participantes, número menor que os 5400 do ano passado.

Não é possível tirar nenhuma avaliação definitiva a partir desses números. Mas eles fazem crer que a maioria dos leitores não gosta da sujeira deixada por trolls e outros comentaristas que, escondidos pelo anonimato da rede, não discutem construtivamente, preferindo tocar o terror em uma tentativa de fazer com que determinado espaço de reflexão deixe de existir.

Reforço, entretanto, que a interação trazida pela via de mão dupla dos comentários, que criticam, corrigem, somam, subtraem, multiplicam, dividem, elevam, é inestimável. Eles podem até não gostar de mim, mas concordando comigo ou discordando, eu amo meus leitores.

O lugar estático, até agora autoconsiderado sagrado e irretocável, do produtor de informação, dá lugar a um cotidiano de trocas muito rico. Com o tempo e a percepção do que significa se expressar na rede e em rede, creio que o comportamento dos que rosnam fora da casinha pode mudar. Estamos apenas começando a colocar em prática as possibilidades de diálogo e de construção coletiva trazidas pela internet. Ou seja, devemos ter cuidado para não jogar o bebê fora com a água suja do banho.

Vamos aos resultados:

1) Como você avalia, na maioria das vezes, o nível dos comentários na internet?

Dispensáveis: 82,86% (em 2013, 83,44%)
Essenciais: 14,53% (em 2013, 14,15%)
Não tenho opinião: 2,6% (em 2013, 2,41%)

2) Alguma vez você já mudou sua opinião sobre um texto ao ler os comentários sobre ele?

Não: 63,02% (em 2013, 57,08%)
Sim: 36,98% (em 2013, 42,92%)

3) Qual o principal tipo de comentário que deveria ser moderado?

Os que cometem crimes de ódio: 58,75% (em 2013, 45,63%)
Os que usam de violência no debate com outros comentaristas: 13,65% (em 2013, 15,31%)
Os que ofendem outras pessoas: 12,31% (em 2013, 16,92%)
Os que usam o espaço para promoção pessoal (tipo, Vendo Fusca 76): 6,43% (em 2013, 9,93%)
Os que tratam de assuntos que não têm relação alguma com o post: 6,04% (em 2013, 9,99%)
Os que ofendem o blogueiro e sua a mãe: 2,51% (em 2013, 1,85%)
Os que vão contra a opinião do blogueiro: 0,31% (em 2013, 0,37%)

4) Como você publica um comentário?

Não publico comentários: 38,65% (em 2013, 38,06%)
Com perfil do Twitter ou Facebook: 30,06% (em 2013, 26,68%)
Com seu nome real: 25,53% (em 2013, 28,28%)
Anonimamente, com nome falso ou apelido: 5,75% (em 2013, 6,97%)

5) Antes de usar a internet, você já tinha enviado cartas para jornais ou revistas?

Não: 78,2% (em 2013, 77,44%)
Sim: 21,8% (em 2013, 22,56%)

6) Você acha que a maioria dos comentários em textos na internet:

São mais conservadores que a sociedade: 54,83% (em 2013, 48,38%)
Refletem a opinião da sociedade: 41,15% (em 2013, 45,13%)
São mais progressistas que a sociedade: 4,02% (em 2013, 6,5%)

7) Você acha que:

Os comentários contribuem com o acirramento de ânimos e a manutenção de preconceitos: 67,47% (em 2013, 57,55%)
Os comentários ajudam no debate: 32,53% (em 2013, 42,45%)

Posição da enquete no dia 26/12/2014, às 10h30. 

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.