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Leonardo Sakamoto

O governo do Paraná ensina uma lição: professor também sangra

Leonardo Sakamoto

29/04/2015 17h04

Ao serem responsáveis pelo cacete nos professores e servidores públicos do Paraná que protestavam contra uma votação na Assembleia Legislativa de um projeto que deve reduzir direitos, o governo Beto Richa e sua base aliada deram, nesta quarta (29), uma aula pública.

No dicionário Houaiss, o significado da palavra "ignomínia" é:

1) Grande desonra infligida por um julgamento público, degradação social;

2) Caráter daquilo que degrada, que humilha, que desonra, que envergonha;

O poder público estadual paranaense mostrou que a palavra pode ter outros significados:

3) Tratar profissionais de educação não com respeito e diálogo, mas com bala de borracha e gás lacrimogênio até dezenas deles sangrarem e desmaiarem no asfalto;

4) Proibir o acesso dos manifestantes à Casa do Povo. Não faz sentido falar em "invasão" porque a Assembleia, pelo menos em tese, já pertence ao povo do Paraná e não a deputados estaduais;

5) Ouvir da polícia que ela está só cumprindo ordens ao descer a taquara nos manifestantes e na imprensa.

6) Agir como se a função do professor na construção do futuro fosse um mero detalhe.

Em fevereiro, milhares de professores e servidores públicos haviam sitiado a Assembleia Legislativa do Paraná em um protesto contra o "pacotão de austeridade" que quer mexer com direitos trabalhistas e previdenciários. O governo Beto Richa tentou emplacar uma votação "expressa" sem passar pelos debates de sempre. Isso enfureceu os manifestantes, que também ocuparam o prédio. Para se ter uma ideia aonde chegou a situação, um grupo de deputados só conseguiu entrar contrabandeado em um camburão da polícia. Por fim, o governo anunciou a retirada das propostas para "reexame" e a fim de "garantir a integridade física dos parlamentares".

Nesta quarta, o pacote foi colocado novamente em votação, protegido por decisões judiciais, escudos e cacetetes. Os manifestantes tentaram entrar para acompanhar e foram reprimidos pela polícia.

Os "ajustes" paranaenses têm sido monitorados com atenção por outros governos municipais, estaduais e federal, que planejam o mesmo. Se der certo por lá, ueba!

Em tempo: De acordo com o governador, "ignomínia" também pode ser sinônimo de "fracassamos retumbantemente com a educação".

Observação: Atualização do dia 30 de abril – a informação dos policiais que teriam se negado a cumprir ordens ainda não se confirmou.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.