Topo

Leonardo Sakamoto

Redução da maioridade penal: PSDB e PT dos anos 80 se uniriam contra isso

Leonardo Sakamoto

30/06/2015 09h17

A proposta que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes violentos e tráfico de drogas está prevista para ser votada na Câmara dos Deputados, nesta terça (30), em primeiro turno. Precisa de 308 votos para ser aprovada.

Em um outro momento, perdido no tempo, talvez PSDB e PT se unissem para impedir que isso acontecesse, uma vez que ambos os partidos estruturaram-se levantando a bandeira dos direitos fundamentais.

Contudo, o PT de hoje, tendo que se explicar diante de graves denúncias de corrupção e não conseguindo resolver a crise de credibilidade na economia, e o PSDB, adepto de uma política de oposição no estilo "o que vale é conquistar o território, mesmo que destruamos tudo no meio do caminho" são incapazes desse necessário diálogo.

O 3o Programa Nacional de Direitos Humanos, cuja crítica raivosa e ensandecida à época de sua divulgação, em 2009, foi um test drive do que seria a onda de ódio atual, explicita a proteção da criança e do adolescente como necessário para a construção do futuro. Suas metas não diferem muito da primeira e da segunda versões, lançadas sob o governo Fernando Henrique.

Não estou dizendo que os partidos são iguais, longe disso. Apenas que há temas que encontram ressonância em ambos os lados e que direitos humanos e a proteção de crianças e adolescentes costumava ser um deles.

Em ambos os partidos, sempre houve muitos contrários à redução da maioridade penal, à adoção da pena de morte e à prisão perpétua e favoráveis à eutanásia, à ampliação dos direitos reprodutivos, ao casamento homoafetivo, à adoção de filhos por casais do mesmo sexo, à pesquisa com células-tronco, a um Estado laico. Seja por anseio de igualdade, seja pela defesa do liberalismo.

Na solidão de suas crenças pessoais, creio que muitos políticos de ambos os partidos concordam com os pontos acima. Ou, mesmo que discordem de alguns, entenderiam que a garantia de determinados direitos de minorias (base da democracia) é uma questão de política pública e não de opinião individual.

Considerando esse Congresso Nacional que, pelo ritmo do retrocesso, vai revogar a República e a Lei Áurea até 2018, seria uma demonstração de racionalidade – quiçá de que ambos não esqueceram dos discursos de suas fundações – se os partidos fechassem posição sobre uma plataforma mínima de direitos humanos que estariam preservadas de se tornarem munição. Daí, que se engalfinhem em outros assuntos relevantes.

Isso, é claro, está no plano da utopia e soa a idiotice, porque a política real, cheia de traições e puxadas de tapete, não permitiria isso. Para tristeza de muita gente de ambos os partidos que ainda acredita que a construção de um país se dá através da ação coletiva e do entendimento, não do medo.

Portanto, não tenho dúvida de que as gerações que virão depois de nós olharão com desprezo para esses congressistas. Não apenas para os Adoradores da Intolerância ou para os Soldados do Ódio, mas para os deputados e senadores que estão em perfeito estado de suas razões.

Pois estes optaram pela saída fácil do populismo, abrindo as portas do Coliseu e entregando jovens aos leões para enganar a massa, ao invés de garantir aos mais pobres o quinhão de dignidade que os mais ricos têm desde o berço, criando uma sociedade mais segura, ainda que imperfeita.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.