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Leonardo Sakamoto

30 Dicas para sobreviver às semanas da discussão do impeachment

Leonardo Sakamoto

09/04/2016 10h30

Estas próximas semanas têm tudo para estarem entre as mais tensas da história recente do país, com a discussão e votação do impeachment de Dilma Rousseff no Congresso Nacional, manifestações pró e contra tomando as ruas , instituições democráticas sendo colocadas à prova a todo o tempo. Isso sem contar a imprensa, tradicional ou alternativa, que terá que realizar seu trabalho de forma razoável, digna e crível – e provar isso.

Mas também vai ser um teste sobre a capacidade de cada um de nós de respirar fundo e refletir diante da tensão. Nos últimos tempos, a quantidade de informação incorreta, distorcida, mal-checada e brotada mais do desejo do que da realidade tomou conta. Como diria um colega jornalista, do maior telejornal ao pequeno site de notícia, está difícil saber se um gato é um fato ou uma falha na Matrix.

Organizei um apanhado de 30 sugestões para ajudar no consumo de informação nestas semanas. Ele não resolve o problema, claro. Solução seria se os brasileiros fossem formados para a mídia e para a tolerância – coisa que não são. Mas pelo menos a lista ajuda na reflexão.

Se checamos a validade, o cheiro e a aparência de um produto antes de comê-lo, por que colocamos para dentro qualquer porcaria que aparece sem questionar?

Seguem as sugestões:

1) Não forme opinião apenas pelo que dizem sites de internet, veículos de imprensa e, principalmente, políticos e lideranças sociais.

2) Desconfie de seus amigos, chefes, colegas, vizinhos, governos. Se você quer prezar sua sanidade mental, considere uma boa dose de cinismo como aliada. Não o bastante para se tornar uma pessoa que não acredita no mundo e no seu semelhante, mas o suficiente para não ser uma cobaia. Agora e sempre.

3) Não tenha medo de soltar um "Para, miga, cê tá loka!" diante de algo que você sabe infundado passado adiante por um conhecido. Lembre-se que o silêncio é cúmplice.

4) Ponha em xeque os ensinamentos de sua família, do seu professor, de seu guru espiritual ou daqueles que dizem falar em nome do seu deus. Duvide inclusive da lista deste jornalista cabeçudo (mas que te ama).

5) Esteja aberto a pontos de vista diferentes dos seus, sem necessariamente comprar as ideias neles presentes.

6) Absorva o máximo de informação possível, de fontes com visões diferentes. Depois, com calma, converse, verifique, reflita e analise antes de formar opinião.

7) Pense. Não deixe que pensem por você.

8) O mundo não precisa ser colorido e engraçado. A vida não é conto de fadas. Conforme-se com isso e pare de fugir, criando bandidos e mocinhos, heróis e vilões, onde eles não existem.

9) Se alguém é petista, psolista, tucano, palmeirense, corintiano, flamenguista, fluminense, Garantido, Caprichoso, esquerda, direita, centro, onívoro, vegano, pedestre, ciclista, motorista não significa que seja o mal encarnado. Talvez apenas pense diferente de você.

10) Criticar as ideias e ações fazem parte do debate público. Mas cuidado para não transformar o outro em nada, desconsiderando-o por sua opinião.

11) Olhe sempre a data de um texto antes de achar que é uma novidade.

12) Fuja de textos anônimos como o diabo foge da cruz.

13) Procure sempre saber quem é o autor de um texto assinado.

14) Desconfie de "evidências" bombásticas e irrefutáveis. Quem se apresenta assim normalmente é fruto de mimimi e blablablá.

15) Busque o contexto em que a notícia está.

16) Leia o texto inteiro e não tire conclusões antes de termina-lo.

17) Não se deixe levar por quem escreve bonito. Ou quem fala bonito.

18) Não se apegue tanto às imagens. Elas são importantes, mas podem ser manipuladas como textos.

19) Leia tantas coisas com as quais discorda quanto com as quais concorda. Isso é difícil, mas entender o outro lado ajuda inclusive a reforçar o seu.

20) Não divulgue notícia sem antes checar se a fonte de informação é confiável.

21) Não espalhe notícias relevantes sem atribuir a elas fontes de informação. Um "cara gente boa" ou um "Best Friend Forever" não é, necessariamente, fonte de informação confiável.

22) Tuítes e posts sem fonte clara, jamais deveriam ser aceitos como instrumento de checagem ou comprovação. Sites que caluniam e não se dignam a informar quem é o responsável, muito menos.

23) Não esqueça que informação precede opinião. Não esqueça que informação precede opinião. Não esqueça que informação precede opinião. Não esqueça que informação precede opinião. Não esqueça que informação precede opinião.

24) Não repasse informações que não fazem sentido algum só porque você não gosta da pessoa ou instituição em questão. A disputa entre posições políticas deve ser baseada em um jogo limpo e não em invenciones.

25) Lembre que mais vale um tuíte ou post atrasado e bem checado que um rápido e mal apurado. E que um número grande de retuítes, compartilhamentos e "likes" não garante credibilidade de coisa alguma.

26) Não esqueça que qualquer apuração feita pessoalmente, por telefone e/ou por e-mail precede, em ordem decrescente de importância, o chute. E que uma profunda reportagem deveria valer mais que um meme na formação da sua opinião.

27) Não tenha pudores de reconhecer, rapidamente e sem poréns, um erro em caso de divulgação ou encaminhamento de informação incorreta. Pedir desculpas é divino.

28) Não é porque algo está circulando na internet, foi impresso em jornal, transmitido por rádio ou apareceu na TV que é verdade. O conteúdo tem que provar que é verdadeiro, pelas evidências que traz, pela credibilidade de quem o traz.

29) Na hora do embate de ideias, tenha calma. Dê a si mesmo o direito de se questionar e se perguntar se está certo. Nossa natureza não é de certezas, e sim de dúvidas.

30) E lembre-se: Falta amor no mundo, mas também falta interpretação de texto.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.