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Leonardo Sakamoto

Reforma Trabalhista: Alguns se negaram a declarar a inutilidade do Senado

Leonardo Sakamoto

20/06/2017 15h01

O projeto de Reforma Trabalhista foi rejeitado por 10 votos a 9, nesta terça (20), pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal. A decisão não tem poder de bloquear o trâmite da matéria, mas funciona como um parecer negativo. Ele segue agora para a Comissão de Constituição e Justiça e, se não for considerado inconstitucional, vai à votação no plenário.

A primeira derrota da Reforma Trabalhista proposta pelo governo Temer na casa teve participação de senadores de partidos de sua base aliada. Já era esperado o voto contrário de Otto Alencar (PSD-BA), suplente do ausente Sérgio Petecão (PSD-AC), mas não o de Eduardo Amorim (PSDB-SE) e de Hélio José (PMDB-DF) – este último próximo do senador Renan Calheiros, que vem fazendo oposição ao Palácio do Planalto.

Assessores de senadores do governo e da oposição afirmaram a este blog que os congressistas estão sentindo a pressão contrária à Reforma Trabalhista, principalmente após as denúncias contra Michel Temer virem a público.

Por enquanto, isso ainda não é suficiente para barrar o trâmite da matéria, considerada prioridade pelos grandes empresários. Teria que ser algo mais forte, como a divulgação de um novo escândalo envolvendo a cúpula da República.

Não sei qual imagem os senadores governistas têm de si mesmos. Mas quem acompanha o processo de votação dessa matéria está com a impressão de que o Senado se tornou um puxadinho da Câmara dos Deputados, um apêndice do Palácio do Planalto e um serviço de entregas do setor empresarial.

A base do governo Temer no Senado Federal está tentando passar, sem modificações, o texto da Reforma Trabalhista que foi aprovado pelos deputados federais. Ou seja, deliberadamente se omite de seu papel de casa revisora, ignorando alterações importantes que contam com o apoio de uma parcela dos senadores da base do governo e da oposição, em nome de um trâmite rápido do projeto. Pois, se o texto já aprovado pelos deputados sofrer alguma alteração pelos senadores, terá que voltar para análise da Câmara.

Temer prometeu que irá vetar pontos e emitir Medidas Provisórias para contemplar as demandas dos senadores governistas. Ou seja, o Senado terceirizaria à Presidência suas funções.

Essa demora poderia reduzir ainda mais o apoio que o capital tem dado a Michel Temer, incumbido por ele de entregar as Reformas Trabalhista e da Previdência Social. E se uma parte dos senadores representa diretamente os interesses do grande empresariado (sendo alguns deles próprios grandes empresários, aliás) e quer ver o projeto aprovado, uma outra parte, envolvida no escândalo da Operação Lava Jato, depende da manutenção do governo Temer para a sua própria sobrevivência política. Ou mesmo liberdade.

Como já disse aqui antes, fica difícil defender a razão de existir de um Senado Federal se ele mesmo abre mão de sua incumbência revisora. Ainda mais diante de um projeto que pode alterar significativamente a qualidade de vida dos trabalhadores brasileiros.

Reforma Trabalhista

Reduzir o número de leis e alterá-las é necessário para o país se adaptar a um novo contexto social, tecnológico e demográfico. O problema apontado por quem é contra a proposta é que esta Reforma Trabalhista não foi discutida em um amplo debate com a sociedade e não é acompanhada do estabelecimento de medidas tributárias para compensar as perdas dos trabalhadores.

Permitir que a negociação entre patrões e empregados fique acima do que diz a lei é o centro da Reforma Trabalhista. Em sindicatos fortes, como alguns de metalúrgicos ou bancários, isso pode render bons frutos. Em sindicatos fracos ou corruptos, negociações tendem a ser desequilibradas a favor dos patrões, aprovando reduções em direitos que coloquem em risco a saúde e a segurança de trabalhadores.

A reforma também dificulta a responsabilização de empresas que tenham trabalhadores escravos produzindo exclusivamente para elas, via terceirizadas; limita o valor de indenização a 50 vezes o último salário do trabalhador – ou seja, a família de alguém que ganha um salário mínimo e morre por conta do serviço receberia, no máximo, R$ 46.850,00; estabelece contratos intermitentes, em que o trabalhador pode ser chamado a qualquer hora, não sabendo quanto ganhará no final do mês e de quanto será seu descanso; acaba com a remuneração do tempo de deslocamento do trabalhador quando não há transporte público disponível; entre outras dezenas de mudanças.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.