E se o horário eleitoral na TV tivesse momentos de sinceridade?
Sou apaixonado por House of Cards. A jornada de vingança do congressista norte-americano Frank Underwood só é comparável à época das melhores temporadas de Gregory House – o médico – e Walter White – o professor de química. Na minha opinião, é claro. Contudo, como todos os episódios são entregues de uma só vez pelo Netflix, a alegria dura apenas algumas madrugadas regadas a café.
Depois, o sinistro vazio.
Não há como deixar de me lembrar de House of Cards com o horário eleitoral obrigatório ressurgindo na TV.
Não pela qualidade, é claro. Frank está muito acima de quase todos os candidatos disponíveis.
Mas, de tempos em tempos, ele vira para o telespectador e explica seus planos, faz uma confissão, enfim: dá a real da política com muito cinismo.
Que, junto com a ironia e o sarcasmo, são as melhores coisas da vida.
Adoraria que, durante suas peças de publicidade do horário eleitoral, os candidatos à Presidência e aos governos estaduais e distrital virassem para a câmera e dissessem também o que estão pensando. Por exemplo:
– É fascinante como as pessoas acreditam em qualquer imagem besta que toque seu coração patético. Poderíamos ter colocado fotos de cachorrinhos, mas seria desnecessário. O povo se contenta com menos.
ou
– O povo é tão mal instruído que não percebe que essa proposta é inexequível, quase um acinte. Mas como números têm um poder sobrenatural sobre a massa, não questionam quando eles aparecem. Dizem amém.
ou ainda
– Hiprocrisia não é eu criticar o setor do meu maior doador de campanha. Hiprocrisia é muitos veículos de comunicação não dizerem nada sobre isso. Talvez porque os maiores doadores são também os maiores anunciantes da imprensa.
A campanha eleitoral tornou-se um momento complicado para a discussão de temas públicos relevantes – ao contrário do que a teoria afirma. É quando marqueteiros dobram a realidade, procurando mexer com a emoção e não a razão dos eleitores. Qualquer tema que seja visto com potencial de angariar ou tirar votos será tratado como um carro novo em anúncio de TV. E vendido como tal. Ou seja, a verdade sobre o objeto em questão é um mero detalhe.
Alguns candidatos e partidos até marcam posições importantes. Mas, com o domínio completo do marketing sobre todas as outras esferas da política, tudo é controlado para dar ao povo o que o povo quer.
Ou acha que quer.
Ou o que um grupo pequeno quer que o povo continue achando que quer.
Por isso, imaginei que os candidatos se virassem para a tela e tivessem o tal momento sincero. Quiçá:
– Cansou? Tá achando ruim? Calma, está só começando…
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