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Leonardo Sakamoto

Grupo armado faz despejo no Tocantins sem mandado

Leonardo Sakamoto

12/07/2007 16h28

(Perdoem-me por ontem. Fatores além da minha vontade me impediram de postar.)

Vou tentar até o final da semana manter uma atualização diária da série "E continua tudo igual no interior do Brasil". Agora, com a região do Bico do Papagaio, norte do Tocantins:

A Comissão Pastoral da Terra de Araguaína divulgou uma nota informando que, na manhã de ontem, homens fortemente armados derrubaram barracos do Acampamento Bom Jesus, localizado na fazenda Recreio, município de Palmeirante (TO). O grupo seria liderado pelos fazendeiros Paulo Freitas e "Pedão" e estava acompanhado por quatro policiais militares e um policial civil:

O despejo foi realizado sem nenhum mandado judicial. As famílias foram ameaçadas, sendo informadas que, no prazo da noite para a madrugada do dia seguinte, se não se retirassem da propriedade, o grupo armado voltaria ao local. Disse um deles: "Volto amanhã cedo e, se encontrar pessoas nesse local, não vou respeitar nem criança nem ninguém. Vou bater em todo mundo!". Outro acrescentou: "Não existe autoridade nenhuma que nos impedirá de tirar vocês daqui, pois essa terra tem dono".

Durante a atuação do grupo armado, estavam presentes no acampamento 15 crianças e 4 mulheres, sendo que os demais acampados (20 homens) estavam trabalhando na roça.

As 30 famílias estavam acampadas desde o dia 8 de abril de 2007 na fazenda. Segundo informações de terceiros, a propriedade é área da União. Em função disso, foi solicitado ao Incra, no dia 21 de maio de 2007, a realização de uma vistoria e o início do processo de desapropriação da área. Simultaneamente, havia sido registrada uma denúncia de desmatamento irregular.

Sinais de possíveis violências haviam sido observados nas últimas semanas: Em 12 de junho de 2007, Edimilson Marçal registrou um boletim de ocorrência na Delegacia de Polícia de Palmeirante, informando a presença de pessoas estranhas nas proximidades do acampamento, tendo as mesmas efetuado vários tiros no intuito de intimidar as famílias acampadas. Em 18 de Junho de 2007, foram levadas ao conhecimento do Ouvidor Agrário do Incra, em Brasília (Gercino José da Silva Filho) e do Comando da Polícia Militar de Colinas-TO (Capitão Limeira) denúncias de ameaças, intimidações e violências, praticadas por Policiais Militares do município de Palmeirante, contra vários trabalhadores rurais (Edmilson Marçal, Gean Antonio da Silva e José Nilton). Tais fatos não foram apurados.

O clima de impunidade fez com que, em menos de um mês, se repetissem novamente as mesmas cenas. Desta vez, a violência física praticada teve como um dos seus autores um dos policiais presentes, conhecido por "Coelho", policial de Palmeirante, o qual bateu com um facão no trabalhador José Nilton.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.