Gilmar Mendes, o MST e o uso do dinheiro público
Eu deixei de me espantar quando o presidente do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes faz declarações públicas que não condizem com a discrição que exige seu cargo. Dessa vez, por conta de um confronto que resultou na morte de seguranças de uma fazenda em Pernambuco (os sem-terra alegam legítima defesa), ele criticou o repasse de recursos públicos a entidades que atuam na luta pela terra.
"Financiamento público de movimentos que cometem ilícito é ilegal, é ilegítimo. Que o Ministério Publico tome providencias para verificar se não há financiamento ilícito a estas instituições", disse Mendes.
Interessante a indignação do magistrado só ter surgido agora. Por que ele não veio a público dizer o mesmo nas centenas de vezes em que ocorreu o contrário, quando grandes empresas e fazendeiros, que receberam recursos públicos do BNDES, Banco da Amazônia, Banco do Nordeste, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, entre outros, estiveram envolvidos direta ou indiretamente com a morte de centenas de trabalhadores rurais, sindicalistas e missionários, com a contaminação e destruição do meio ambiente, o trabalho escravo e o infantil, a expulsão de comunidades tradicionais de suas terras, a grilagem de terras, a corrupção de políticos e de funcionários públicos? Será que é pelo fato de que, no Brasil, boa parte do Poder Judiciário age com dois pesos e duas medidas, para ricos e pobres?
Qualquer assassinato tem que ser desvendado, seja quem for o autor ou a vítima. Portanto, espero que os crimes em Pernambuco sejam resolvidos e condenados os culpados ou absolvidos os inocentes. A sacanagem é usar o caso como chantagem ou justificativa para recomeçar uma caça às bruxas, semelhante ao que se tentou fazer na CPI da Terra anos atrás. Fazem parecer que os recursos repassados a entidades sociais no campo são usados para fazer ocupações e orgias, ignorando o desenvolvimento em educação e tecnologia rurais obtidos em pequenas comunidades com esses investimentos nos últimos anos. E ignorando que sem a pressão dos movimentos sociais, o pouco de reforma agrária que ocorreu nem teria sido realizada.
Ah, mas pelo menos, uma coisa boa surge disso tudo. Se Gilmar Mendes for um homem coerente – e acredito que seja – a sua indignação pública contra os sem-terra indica que o ministro também será favorável a qualquer mecanismo de bloqueio de crédito e financiamento públicos a empresas e fazendeiros que cometam crimes como o desmatamento ilegal ou qualquer outro que enumerei acima. O que ele disse nesta quarta – "Que o Ministério Publico tome providencias para verificar se não há financiamento ilícito a estas instituições" – serve também para isso.
E urgente, pois qualquer passarinho sabe que, desde a fundação da nação, dinheiro público é entregue às mãos de expoentes do poder econômico privado (de latifundiários, passando por industriais ao setor de serviços), que cometem sérias delinquências, impunemente.
PS: Apenas para informar: alguns leitores publicaram comentários como se fossem este autor. É engraçado ver vários Sakamotos participando do debate, com diferentes personalidades. Mas quem acompanha este blog sabe que prefiro responder aos leitores nos próprios posts, dando destaque à sua participação.
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