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Leonardo Sakamoto

Justiça condena fazendeiro por escravizar 59 no Pará

Leonardo Sakamoto

08/12/2011 11h07

Do Ministério Público Federal no Pará:

O fazendeiro Avelino de Déa, dono da fazenda São Sebastião, em Itupiranga, no Pará, foi condenado a sete anos e dez meses de prisão por escravizar 59 trabalhadores. A sentença, do juiz federal Cesar Otoni de Matos (processo número 2009.39.01.001493-9), foi assinada em novembro mas só chegou agora ao Ministério Público Federal em Marabá, autor da denúncia penal. Também foi condenado o capataz José Henrique Vanzetto, a cinco anos e sete meses de prisão.

Os 59 trabalhadores foram libertados em operação do grupo móvel de fisalização do governo federal em setembro de 2007. Na fazenda, que contava com 3 mil cabeças de gado, os trabalhadores foram encontrados na limpeza do pasto e na construção de cercas. Alguns chegaram a dormir em cochos.

"Os trabalhadores eram submetidos a condições as mais indignas de trabalho: não havia banheiro no local onde laboravam e pernoitavam, o qual distava vários quilômetros da vila mais próxima; não havia depósito de lixo; a água para beber era retirada do córrego, barrenta e com gosto de ferrugem e também utilizada pelo gado, que nela defecava; dormiam muitos em barracos de palha sem paredes laterais, onde conviviam com cobras e escorpiões, chegando alguns a dormir em cocho próprio para alimentação de bovinos", enumera a sentença judicial.

Além de tudo, ainda faltavam equipamentos de proteção individual, mesmo para quem trabalhava aplicando venenos e havia exploração da mão de obra infantil. O juiz, corroborando os argumentos do MPF, não admitiu a alegação dos réus "de que não forçaram ninguém a aceitar o trabalho".

"O fato de cidadãos pobres e humildes aceitarem a indigna sujeição a tal tipo de condições – o que fazem em razão da absoluta falta de alternativa para garantia da própria subsistência, como confessado nos autos – não autoriza outrem, valendo-se da privilegiada posição de detentor do conhecimento e do poder econômico, literalmente lucrar com a miséria e desgraça alheias", diz a sentença.

Por causa de atenuantes, os réus terão o direito de cumprir a pena em regime semi-aberto. Ainda cabe recurso da sentença.

Essa notícia divulgada pelo MPF não deixa de ser um alento. Afinal de contas, condenações criminais por trabalho escravo no Brasil são raras – a despeito de iniciativas importantes, como a da Vara Federal de Marabá, que condenou 27 fazendeiros, em março de 2009, de uma só vez. As sentenças foram assinadas pelo juiz federal Carlos Henrique Haddad e se tornaram referência no meio jurídico.

Alguns exemplos de casos de condenações em que a punição, digamos, ocorreu e não ocorreu:

O fazendeiro Gilberto Andrade, do Maranhão, foi condenado pela Justiça Federal em 2008, mas recorreu da sentença (de 14 anos de prisão pelos crimes de trabalho escravo, ocultação de cadáver e aliciamento de trabalhadores) em liberdade até falecer.  Ele foi quatro vezes reincidente no crime. Também no Maranhão, a Justiça Federal considerou Alcídes Reinaldo Gava e José Milton Campelo culpados por trabalho escravo. A sentença saiu em 2008 e previu a pena de 3 anos e meio de reclusão. Porém, foram substituídas por penas restritivas de direitos.

Colaborou Bianca Pyl, da Repórter Brasil.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.