Topo

Leonardo Sakamoto

Como garantir que trabalhadores negociem em pé de igualdade com patrões?

Leonardo Sakamoto

23/07/2017 23h50

Sou a favor do fim da obrigatoriedade de que trabalhadores paguem um dia de trabalho ao ano para o sindicato que os representam, um dos (raros) pontos bons da Reforma Trabalhista aprovada. Defendi isso várias vezes neste espaço. E também defendo o fim da unicidade sindical, o que não estava no projeto, pois depende de uma mudança na Constituição Federal. Ou seja, chega de apenas um sindicato representar uma categoria por região. O trabalhador tem o direito de escolher quem o represente.

Mas só isso não basta.Em negociações coletivas, deveriam ser envolvidos os representantes de empregados e empregadores de todas as atividades de uma mesma cadeia de valor. Se isso acontecer, as conquistas obtidas pelos empregados diretamente contratados também valeria para os das empresas terceirizadas de de fornecedores.

Por exemplo, metalúrgicos que trabalham para pequenas empresas de autopeças seriam beneficiados pelos ganhos nas negociações que os trabalhadores da montadora. E cortadores de cana teriam as mesmas proteções e os mesmos acessos a benefícios que os empregados das áreas industriais das mesmas usinas sucroalcooleiras. Isso desestimularia a terceirização com o objetivo de ganhar competitividade baseado na superexploração de trabalhadores.

(Desconfio, contudo, que parte do Congresso Nacional e da cúpula do governo federal querem mais é que o trabalhador se exploda.)

E já que estamos falando em moralização, vamos acabar também com a contribuição obrigatória de bilhões para o sistema S. As associações empresariais defenderam o fim do imposto sindical porque a queda em sua arrecadação decorrente disso não será expressiva. Afinal, a maior mordida nas entidades de empresários é através da contribuição obrigatória para o sistema S, que é de onde elas tiram seu poder de influência. Senac, Sesc, Senai e Sesi fazem um trabalho importantíssimo, que deve continuar sendo financiado. Mas essa contribuição também deveria ser voluntária, além de mais transparente.

Devem ser incentivadas as negociações entre empregados e empregadores. O problema é que o projeto de Reforma Trabalhista aprovado pelo governo Temer deve ampliar isso sem garantir que os dois lados estejam em pé de igualdade. Em certas categorias, será um massacre. Como defendi aqui várias vezes, antes da Reforma Trabalhista deveria ter ocorrido uma Reforma Sindical.

Há um porém: da mesma forma que o fim da unicidade sindical não está na mesa porque é matéria constitucional, muitos são os que apontam o mesmo para o fim da contribuição sindical obrigatória. Ou seja, haverá questionamentos até que o Supremo Tribunal Federal decida sobre o tema. Portanto, é provável que os principais beneficiados com essa mudança no curto e médio prazos não sejam nem patrões, nem trabalhadores, mas os escritórios de advogados.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.