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Leonardo Sakamoto

Dá para incluir Temer no Programa de Desligamento Voluntário do governo?

Leonardo Sakamoto

27/07/2017 10h44

Michel Temer e Rodrigo Maia. Foto: Givaldo Barbosa/Agência o Globo

O governo federal anunciou um Programa de Desligamento Voluntário (PDV) de servidores públicos com o objetivo de cortar cerca de R$ 1 bilhão por ano em folha de pagamento.

Mais uma vez o poder público federal demonstra ser insensível às necessidades do país e produz uma proposta frustrante, uma vez que a ação é limitada a funcionários públicos concursados do poder executivo federal. Ou seja, deixa de fora quem está queimando loucamente o dinheiro do contribuinte: o próprio Michel Temer.

A cada dia que permanece na Presidência da República, ele aumenta o rombo no orçamento do país. E não é pelos canapés e uísque consumidos no Palácio do Jaburu, muito menos pelo danoninho do seu pimpolho.

Com a análise do pedido de seu afastamento para que seja julgado por corrupção passiva pelo Supremo Tribunal Federal, Temer "comprou" o voto de deputados na Comissão de Constituição e Justiça, liberando centenas de milhões em emendas parlamentares, mas também cargos na administração federal.

E não parou por aí: Temer tem recebido dezenas de deputados para pedir votos contra a denúncia no plenário da Câmara dos Deputados – o que não sai de graça, claro. A bancada ruralista, por exemplo, está vendendo seu apoio na forma de redução dos direitos das populações indígenas a seus territórios e de perda de proteção ambiental. A relação entre Congresso e Planalto que nunca foi muito republicana, transformou-se em feira livre descarada.

Nem quero imaginar os pedidos da bancada do fundamentalismo religioso. Crucifixos em instituições públicas em um país laico? Ops, isso já existe… Preces coletivas antes do início de todas as aulas em universidades federais?

Lembre-se que acabou de ocorrer uma forte alta no valor dos impostos dos combustíveis. Ou seja, cada vez que for abastecer o seu amado carro saiba que os centavos a mais por litro se tornam milhões que vão irrigar essa esbórnia. Considerando que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, avisou que outras denúncias contra Temer, como a de obstrução de Justiça, estão no forno, a sangria vai ser longa.

Enquanto isso, outros setores do governo têm que se desdobrar para economizar aqui e ali, correndo o risco de interromper fiscalizações de trabalho escravo e trabalho infantil.

Li algumas vezes o texto da medida provisória. O pior é que, além dela não ser aplicável ao ocupante do Palácio do Planalto, também não se esforça em garantir benefícios que possam ser atrativos a ele.

O bônus oferecido de 25% do salário por ano trabalhado é pó comparado a uma mala carregada por Rodrigo da Rocha Loures com R$ 500 mil. Benefícios previdenciários também não interessam, até porque Temer recebe, desde os 55 anos, uma bela aposentadoria como ex-procurador do Estado de São Paulo. Talvez a possibilidade de licença sem remuneração por três anos o agradasse, curtir umas férias, escrever poesias. O problema é que o efeito colateral, a chegada de Rodrigo Maia para esquentar a cadeira presidencial durante esse período, agrada a uma parte dos empresários e do mercado, mas não ao resto do país.

Esse PDV é interessante.

O governo corre o risco de perder os seus melhores quadros com o programa, pessoas que adquiriram experiência, redes, contatos, informações privilegiadas, trabalhando para o setor público e que conseguiriam recolocação imediata no privado. Ou seja, vai ser um bom incentivo para perdermos capacidade técnica institucional. Ao mesmo tempo, aquela parte do funcionalismo que já não produz certamente continuará – ainda mais em uma crise pesada como a que vivemos.

Para o marketing junto aos incautos, ótimo. Irão crer que será reduzida a ineficiência do Estado. Na prática, pode ocorrer o contrário: ela ser agravada com isso.

A fim de aumentar a credibilidade das instituições, o que levaria a um aumento dos investimentos internos e externos, é necessária uma estabilidade política que a atual administração se provou incapaz de garantir.

Nesse sentido, ao invés de conclamar 5 mil pessoas, como prevê estimativa do governo federal, a se desligarem de seus cargos, que tal pedir a uma só?

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.