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Leonardo Sakamoto

Não só as ricas: STF analisa prisão domiciliar às mães de filhos pequenos

Leonardo Sakamoto

18/12/2017 18h25

Foto: Márcia Foletto/ Agência O Globo

O ministro Gilmar Mendes garantiu a Adriana Ancelmo, esposa do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, o retorno à prisão domiciliar. Ela havia sido condenada por associação criminosa e lavagem de dinheiro. A justificativa, a mesma de uma decisão anterior da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, baseia-se no fato dela ter um filho pequeno.

Para que isso não soe como proteção a quem tem dinheiro e poder, o Supremo Tribunal Federal precisa decidir urgentemente pela extensão do mesmo direito em favor de todas as mulheres gestantes ou mães de crianças de até 12 anos em situação de prisão provisória. A legislação também prevê a comutação da pena cumprida em penitenciária para prisão domiciliar nesses casos.

O ministro Ricardo Lewandowski está para decidir sobre uma ação movida pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (Cadhu), que pediu ao Supremo Tribunal Federal um habeas corpus coletivo a todas as mulheres nessas condições, seja elas ricas ou pobres. Os advogados usaram como base para o pedido a decisão concedida a Adriana.

"O caso de Adriana Ancelmo expôs a enorme seletividade do sistema de Justiça, inclusive do Ministério Público e do Judiciário", afirma Eloísa Machado, professora da FGV Direito SP, coordenadora do Centro de Pesquisa Supremo em Pauta e membro do coletivo de advogados em entrevista ao blog. "A lei determina que mulheres presas provisoriamente grávidas e mães podem ser inseridas em regime domiciliar e essa lei deveria valer para todas."

Para ela, entre as razões da Justiça ser seletiva está o fato do Brasil ser um "país racista e desigual" – o que contamina as instituições que devem executar a legislação. "Uma parte da população usufrui as garantias do estado de direito e outra não. Isso não se resolve deixando de aplicar a lei a todos, mas ao contrário."

O objetivo do pedido de habeas corpus seria democratizar a decisão às demais mulheres que não contam recursos para levar essa demanda aos tribunais, com a esposa do ex-govenador do Rio.

Lewandowski determinou que o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça informasse ao STF quais e quantas mulheres presas gestantes ou mães de crianças abaixo de 12 anos estão presas provisoriamente no país. Com isso, centros de detenção provisória, delegacias e carceragens, pela primeira vez, tiveram que se preocupar com as mulheres pobres presas, saber se estavam grávidas ou se têm filhos pequenos.

As informações já foram encaminhadas aos STF para que o ministro decida sobre o pedido de liminar.

De acordo com os dados do Depen, o número de presas passou de 5.601, em 2000, para 44.721, em 2016 – ou seja, multiplicou-se por oito. O Brasil está quinto lugar no ranking mundial de encarceramento feminino, atrás somente de Estados Unidos, China, Rússia e Tailândia. Cerca de 60% das detidas respondem a crimes ligados ao tráfico de drogas, mas a grande maioria não ocupava postos de comando.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.