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Leonardo Sakamoto

PT deveria pensar novas formas de combater o pixuleco e não o Pixuleco

Leonardo Sakamoto

26/01/2018 23h09

Vista geral da produção de Pixulekos em fábrica de São Paulo. Foto: Sebastião Moreira/EFE

Longe de mim reduzir a importância que determinados objetos assumem na vida das pessoas. Ainda mais quando eles são símbolos construídos com o intuito de atacar e ferir, envernizados com camadas de ironia, cinismo e escárnio. Em alguns casos, a exibição pública desses objetos pode se tornar insuportável para determinados grupos sociais já estigmatizados.

Mas quando a primeira reunião da executiva do principal partido de oposição do país, logo após a condenação em segunda instância de seu líder máximo, começa tratando de Pixulecos (como ficaram conhecidos os bonecos infláveis que representam a caricatura de um Lula presidiário, usados por movimentos antipetistas ultraconservadores), é que algo está muito errado.

A senadora Gleisi Hoffmann, presidente do PT, afirmou que era hora de tolerância zero com o boneco – no que foi apoiada pelos presentes, segundo reportagem do UOL. Mesmo que o comentário seja relativizado, afinal teria sido dito no início da reunião, quando os convidados ainda estavam chegando, conforme confirmaram alguns dos presentes a este blog, não deixa de ser digno de nota.

Considerando que essas reuniões privadas são, na verdade, públicas (jornalistas que cobrem política ficam sabendo do conteúdo de encontros importantes de grandes partidos antes mesmos deles acabarem por intermédio dos participantes), a presidente do PT deveria ter enviado outro "recado".

Um vez que a reunião discutiu a importância de reconquistar parte da classe média, que se afastou do PT com a crise econômica do governo Dilma e as denúncias de corrupção da Lava Jato, ela poderia ter começado afirmando que era hora de seu partido declarar tolerância zero à corrupção de qualquer um de seus membros.

Alguns militantes vão me lembrar que o partido já fez isso, que aprovou leis sobre o assunto, que deu liberdade à Polícia Federal, que nunca antes na história deste país combateu-se tanto a corrupção quanto em seus governos, enfim. Mas  também houve muita corrupção sob as administrações do PT. E muita empresa grande foi indevidamente beneficiada. E muita gente ficou rica.

O candidato que quiser vencer as eleições presidenciais de outubro de 2018 junto à classe trabalhadora terá que dar propostas para a geração de empregos de qualidade, a implementação de uma política que reduza o número de assassinatos no país e a manutenção do combate à corrupção.

Este momento é simbólico para uma autocrítica, que não deve ser confundido com mea culpa. Mas analisar o que deu certo e o que deu errado e corrigir o rumo. É necessário manter o combate à corrupção e, ao mesmo tempo, combater a judicialização da vida política, o linchamento público de políticos e a defenestração das liberdades individuais. E abandonar a realização de alianças e a aceitação de acordos em nome da governabilidade. Fazer isso seria uma sinalização importante, uma vez que a pauta anticorrupção nunca foi monopólio de grupos conservadores.

Ao mesmo tempo, quem achar um boneco inflável ofensivo, que procure as vias judiciais para fazer reclamações. Claro que uma personalidade pública como a do ex-presidente Lula, bem como a de outros candidatos à Presidência da República, têm que aceitar limites maiores de ataques do que cidadãos comuns. E não tenho dúvidas que há muitos juízes antipetistas, que não escondem esse status em suas redes sociais, e não teriam pudor de proferir decisões desequilibradas contra ele. Mas essa saída ainda é melhor do que resolver as coisas com as próprias mãos.

Este ano, a esfera pública pode se transformar em um grande campo de batalha. O grupo político que não agir como criança, usando justificativas pueris como "eles que começaram primeiro", nem tentando destruir o adversário, mas confiar no diálogo e da participação social como soluções possíveis, será mais capaz de impedir que as tensões e desconfianças nos inviabilizem como país nos próximos quatro anos.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.