Impostos: Quanto tempo até Paulo Guedes pedir o divórcio de Bolsonaro?
A criação de uma nova CPMF não foi a única polêmica causada pela relevação das propostas tributárias de Paulo Guedes – guru econômico de Jair Bolsonaro – a um pequeno grupo de investidores.
A jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, mostrou, nesta quarta (19), que Guedes apresentou a proposta de criação de uma faixa unificada de IR de 20% – o que significaria aumentar o imposto de quem ganha menos, acabando com as alíquotas de 7,5% (base de cálculo entre R$ 1.903,99 e R$ 2.826,65) e 15%(entre R$ 2.826,66 e R$ 3.751,05). E baixar de quem ganha mais, acabando com as de 22,5% (de R$ 3.751,06 a R$ 4.664,68) e de 27,5% (acima de R$ 4.664,68).
Mais tarde, Guedes negou a José Fucs, de O Estado de S.Paulo, que pretenda unificar as alíquotas do IR de pessoas físicas. Segundo ele, sua proposta é apenas baixar as alíquotas de 22,5% e 27,5% para 20%.
Isso beneficia a fatia do eleitorado em que Bolsonaro está em primeiro lugar. Segundo a última pesquisa Ibope, desta terça (18), ele ostenta seu melhor desempenho entre que ganha acima de cinco salários mínimos por mês (41% de intenções de voto).
Pouco importa se mudou de opinião pela repercussão negativa ou não. A medida continua indo no sentido contrário do que ele mesmo defendeu na entrevista ao Estado, que é preciso tornar os impostos progressivos (quem ganha mais paga mais) e socialmente mais justos.
A discussão mais urgente seria uma atualização da tabela do Imposto de Renda, que – hoje, defasada – pune a classe média. Outra opção analisada por outras candidaturas e que foi, inclusive, alvo de discussão da atual equipe econômica do governo federal é a criação de alíquotas maiores, de 30% ou 35%, por exemplo, para quem ganha valores como R$ 30 ou R$ 40 mil/mês.
Mudanças como essas não resolvem nosso problema fiscal, mas ajudam a reduzir a percepção de que o Estado serve apenas a quem mais tem.
Mas é fundamental reconhecer que Guedes propõe algo que vem sendo acertadamente defendido também por outras candidaturas, como as de Ciro Gomes, Fernando Haddad, Geraldo Alckmin e Marina Silva, e que foi debatido no governo Michel Temer (mas abortado por pressão do poder econômico): o retorno da tributação de dividendos, os lucros de empresas distribuídos a acionistas. Eles são uma das principais fontes de renda dos super-ricos no país.
Ele propõe que os dividendos sejam taxados em 20%, alíquota superior aos 15% que eram tributados até que o governo Fernando Henrique sumiu com o imposto. Para não aumentar a carga tributária (e ficar dentro da média dos países da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas cairia de 34% para 15%, de acordo com sua proposta.
Quem reclama de bitributação não vê que nosso modelo de isenção dos dividendos só é feito aqui e na gloriosa Estônia.
A desigualdade dificulta que as pessoas vejam a si mesmas e as outras pessoas como iguais e merecedoras da mesma consideração. Leva à percepção de que o poder público existe para servir aos mais abonados e controlar os mais pobres. Ou seja, para usar a polícia e a política a fim de proteger os privilégios do primeiro grupo, usando violência contra o segundo, se necessário for. Com o tempo, a desigualdade leva à descrença nas instituições. O que ajuda a explicar o momento em que vivemos hoje.
Guedes também prometeu subir o IR cobrado de prestadores de serviço que possuem empresas individuais para 20% a fim de evitar uma migração de vagas regidas pela CLT (e que recolhem mais impostos) para uma situação de "pejotização".
Após seu "Posto Ipiranga" (como Bolsonaro chama o economista por conta da propaganda que promete que, por lá, tem tudo o que você precisa) aparecer na imprensa vinculado a sugestões de aumento e criação de impostos, o presidenciável postou, nas redes sociais, que sua "equipe econômica trabalha para redução de carga tributária, desburocratização e desregulamentações".
E completou: "Chega de impostos é o nosso lema! Somos e faremos diferente. Esse é o Brasil que queremos!". Na sequência, muitos de seus aliados vieram a público para lembrar que a última palavra é a do presidente, praticamente desautorizando o economista.
Uma das perguntas mais direcionadas a Bolsonaro nos debates e sabatinas é o que acontecerá se ele e Paulo Guedes baterem de frente, já que o candidato não consegue se aprofundar em nenhuma proposta para a área econômica e já afirmou que vai entregar as decisões da área a ele.
O ex-capitão garante que os dois não vão se desentender, mas que, no fim, a última palavra seria de quem teve voto. Agora, nem ele foi eleito ainda e uma confusão já surgiu.
A saída de cena do presidenciável por conta do atentado e a consequente desarticulação de sua equipe e aliados, mostraram um alto nível de centralização do deputado federal e dependência de seu entorno. Na sua ausência, já teve de tudo – de vice mais saidinho até barata-voa envolvendo a coordenação da candidatura.
Mas esse tipo de bateção de cabeça na economia, por outro lado, indica falta de experiência política de Guedes e de noções de administração pública e econômica de Bolsonaro.
Como o mercado gosta de um autoengano, tem entregado seu apoio ao ex-capitão, de trajetória estatista e nacionalista, por conta do avalista neoliberal, acreditando que esse "casamento" vai durar, ao menos, quatro anos.
Se isso que aconteceu hoje é um sinal da estabilidade desse noivado, Guedes pode pedir o divórcio antes do fim da lua de mel.
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