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Leonardo Sakamoto

Advogados pedem federalização de casos de violência por motivo eleitoral

Leonardo Sakamoto

12/10/2018 18h05

Enterro do mestre de capoeira e compositor Moa do Katendê, morto a facadas, vítima da violência política nestas eleições

O Coletivo Advocacia em Direitos Humanos protocolou, nesta sexta (12), uma representação na Procuradoria-Geral da República solicitando que o Ministério Público Federal concentre todas as investigações e denúncias de violência física e verbal provocadas por intolerância e discordância política no período pré-eleitoral. Na avaliação dos advogados, os órgãos estaduais não tem dado a devida atenção às agressões e suas consequências.

"Apenas uma investigação de âmbito nacional pode entender e combater o problema com a clareza e a firmeza necessárias", diz o pedido. "Os ataques estão sendo realizados neste momento em diversos locais do país e o que temos percebido é que as instâncias locais são incapazes de enfrentar, de forma organizada e sistemática, as violações", diz a representação.

"É a primeira vez que a PGR vai precisar responder a um movimento de intolerância caracterizado como grave violação de direitos humanos", explicou ao blog Eloísa Machado, professora da FGV Direito SP, umas das advogadas que subscreve a ação.

"Movimentos populistas e nacionalistas de extrema-direita têm promovido ações de discriminação contra minorias, de acordo com a relatora especial sobre formas contemporâneas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância das Nações Unidas. O mesmo pode estar acontecendo no Brasil", completa a advogada.

A representação demanda os seguintes pontos:

–  Criação de uma operação de caráter nacional, integrada às Procuradorias Regionais dos Direitos dos Cidadãos, para sistematização e análise de todos os atos de violência intolerante no contexto das eleições presidenciais de 2018;

– Criação de um canal de comunicação para recebimento de denúncias;

– Adoção de providências cautelares, como salvo condutos, ou medidas de proteção à pessoas ameaçadas, na medida de sua necessidade.

– E, após as investigações, a federalização de todos os casos. Ou seja, que eles sejam deslocados da Justiça Estadual para a Justiça Federal.

A centralização dos dados permitiria concluir se os atos são difusos, coordenados ou incitados. Ou seja, apurar as responsabilidades direta e indiretas.

De acordo com comunicado enviado pelos advogados à imprensa, os casos relatados nos veículos de comunicação trazem indícios de crimes de intolerância política combinados a um discurso discriminatório, também intolerante, contra minorias.

"Esses casos de agressões, em sua maioria são contra mulheres, lésbicas e gays, negros e negras, nordestinos e nordestinas, e não apenas afetam a integridade física das pessoas, mas representam também um ataque a sua liberdade política", explica Eloísa Machado.

"Historicamente, o Brasil é um país violento contra negros, mulheres, nordestinos, indígenas e LGBTTTIs, mas o que se percebe agora é algo diferente: os atos de violência estão intimamente associados não só a motivação política, mas às eleições presidenciais, especificamente, por isso precisam ser tratados em âmbito federal." Thiago Amparo, também advogado da ação, afirma que há um movimento sistemático e nacional de intolerância, em especial contra negros e LGBTTTis, que pode se caracterizar como grave violação a direitos humanos.

De acordo com o CADHu, que trabalha voluntariamente em ações sobre o tema, as agressões contrariam tratados ratificados pelo país, como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, o Pacto de São José da Costa Rica, Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas Discriminação Racial, Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher e a Convenção Interamericana Contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.