Tem coisas que a gente não vê. Mas que elas existem, existem
Declaração dada pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO), vice-presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil e relatora da comissão sobre a Usina Pagrisa (pivô das recentes discussões entre senadores e entidades que atuam no combate ao trabalho escravo) em uma entrevista publicada na Folha de S. Paulo de hoje:
"Não sou escravocrata. Quando meu filho me pergunta se a condição de trabalho de um empregado é boa, pergunto se a minha neta poderia viver no lugar. O que não quero para mim não quero para os outros. Nunca vi trabalho escravo no Brasil. Tem de diferenciar o que é irregularidade trabalhista e trabalho degradante, coisas erradas, da escravidão."
Infelizmente, existe sim trabalho escravo no Brasil. E no Tocantins, estado da senadora, a situação é preocupante.
Até hoje foram libertados mais de 26 mil no país, de acordo com dados do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O sistema de fiscalização de denúncias foi criado em 1995, quando o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (da coalizão liderada pelo PSDB e que contava com o PFL, hoje DEM) reconheceu a existência de trabalho escravo diante da Organização Internacional do Trabalho. Em 2003, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desenvolveu esse sistema, com o lançamento do Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.
De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de um total de 20.322 libertados da escravidão desde 2003 em todo o país, o Tocantins está em quarto lugar desse ranking, com 1.841, após Pará (6.974), Mato Grosso (2.953) e Bahia (2.315).
No estado, a CPT registrou 43 denúncias de fazendas ou carvoarias envolvidas com essa prática em 2004, 40 em 2005, 36 em 2006 e 15 até este momento em 2007. Considerando as libertações ocorridas entre 2003 e hoje, o Tocantins é o terceiro estado que mais fornece seus filhos para a escravidão (9,2%), após o Maranhão (34,3%) e Pará (10,8%). O município de Ananás, no Norte do estado, aparece em sexto na lista dos municípios de nascimento de trabalhadores resgatados.
Para tentar combater essa situação, o governo do Tocantins – que reconhece a existência do problema – aprovou uma lei, considerada umas melhores do Brasil para o combate ao trabalho escravo, que impede o estado de fechar negócios com empresas e fazendas que utilizaram esse tipo de mão-de-obra. A lei já foi colocada em prática.
O Tocantins também criou uma Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo, que conta com a participação do poder público e da sociedade civil, e formulou um Plano Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo, que deve ser lançado em breve. Na terça feira, durante encontro dos secretários estaduais de justiça e direitos humanos, o representante do Tocantins assinou uma moção coletiva, solicitando o retorno dos grupos móveis de fiscalização, que verificam denúncias de trabalho escravo e libertam pessoas.
Tem coisas que a gente não vê. Mas que elas existem, existem.
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