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Leonardo Sakamoto

O bem e o mal na opinião do agronegócio brasileiro

Leonardo Sakamoto

19/03/2008 23h28

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) divulgou este mês a "Lista de Proposições Parlamentares de Alto Impacto para a Agropecuária Brasileira", organizada pela superintendência técnica da entidade. Segundo o levantamento, há no Congresso Nacional 1.879 proposições que, na opinião da CNA, impactam o agronegócio, das quais 904 estão em tramitação. Elas estão divididas em proposições convergentes e divergentes para a agropecuária – também de acordo com ela.

Vale a pena a leitura das duas partes para entender como pensa a entidade máxima da agropecuária brasileira, seus técnicos e políticos. Com raras exceções, as medidas que melhoram a vida do trabalhador, protegem o meio ambiente, garantem direitos às populações tradicionais e discutem a concentração de terras são consideradas "divergentes". As que contribuem para os ganhos econômicos e retiram os "entraves" para o lucro (como indígenas e sem-terra) são boa parte das "convergentes".

Para ter uma idéia do show de horrores, a proposta de emenda constitucional número 438/2001 que prevê o confisco de terras em que trabalho escravo seja encontrado é o quarto da lista de proposições divergentes. Pelo fim do trabalho escravo? Pra que? Vem dando tão certo…

No mesmo dia (quarta-feira, 12) em que este documento era lançado, centenas de trabalhadores rurais, membros de movimentos sociais, juristas, artistas, cantores, ministros, deputados, senadores, juízes, procuradores, organizações de direitos humanos e entidades das Nações Unidas, entre outros, faziam um ato na Câmara dos Deputados pela aprovação da PEC, que culminou em um "abraço" ao prédio do Congresso Nacional.

Sim, é um banho de sinceridade (o que não é ruim, pelo menos eles falam o que pensam). Mas é também uma forma dos eleitores saberem o que fazem os seus representantes políticos nas horas de trabalho, uma vez que as proposições vêm com seus respectivos autores. Com a alta das commodities, o agronegócio – que já era atrevido – está saindo da toca e mostrando que suas garras são maiores ainda. Que se cuidem os trabalhadores rurais, posseiros, sem-terra, ribeirinhos, quilombolas e comunidades indígenas dessa nação.

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Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.