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Leonardo Sakamoto

Medida que permite a ministros convocarem Força Nacional é questionada no Congresso

Leonardo Sakamoto

04/05/2013 13h44

Parlamentares afirmam que o decreto presidencial que permite a ministros convocarem tropas é inconstitucional e defendem que a alteração seja revista. Após a promulgação do decreto presidencial que alterou o funcionamento da Força Nacional, o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, convocou tropas para proteger técnicos para levantamentos visando ao Estudo de Impacto Ambiental da construção de hidrelétricas no rio Tapajós, projeto que enfrenta resistência de indígenas e ribeirinhos. A matéria é de Daniel Santini, da Repórter Brasil:

Parlamentares do PSol apresentaram na Câmara dos Deputados e no Senado Federal projetos de lei para tentar reverter o decreto presidencial n.º 7.957/2013. Promulgado em março, o mesmo alterou diversos aspectos do funcionamento da Força Nacional de Segurança Pública, possibilitando que ministros convoquem as tropas mesmo sem aval dos respectivos governantes locais. Antes, conforme o decreto de criação as tropas só poderiam atuar em território nacional com solicitação do respectivo governador de Estado ou do Distrito Federal.

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Na prática, a mudança confere ao Poder Executivo força policial própria. A alteração foi tema do artigo publicado pela Repórter Brasil "A nova guarda pretoriana de Dilma Rousseff", de João Rafael Diniz, advogado e membro do grupo Tortura Nunca Mais – SP. No Congresso Nacional, os questionamentos foram feitos pelo deputado federal Ivan Valente (PSol-SP) e pelo senador Randolfe Rodrigues (PSol-AP), que propuseram, respectivamente, os Projetos de Decretos número 829/2013 na Câmara dos Deputados, e número 86/2013 no Senado Federal.

No projeto apresentado na Câmara, Ivan Valente aponta que a mudança é inconstitucional. "Essa alteração é uma afronta à Constituição, pois permite ao governo federal enviar a Força Nacional de Segurança Pública para qualquer parte do território nacional sem a aquiescência do ente federado responsável pelo policiamento ostensivo e manutenção da ordem pública. A Constituição Federal determina em seu artigo 144 que a responsabilidade por 'polícia ostensiva e a preservação da ordem pública' é das polícias militares dos estados, subordinadas aos respectivos governadores. À União restam duas possibilidades: intervenção federal no estado (artigo 34), ou decreto de estado de defesa (artigo 136), ambas situações excepcionalíssimas de garantia da segurança e integridade nacionais, em que serão acionadas as Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica)".

O parlamentar lembra que logo após a promulgação do decreto presidencial que alterou o funcionamento da Força Nacional, o ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, convocou a tropas para proteger 80 técnicos para que fizessem levantamentos necessários para o Estudo de Impacto Ambiental de construção de hidrelétricas no rio Tapajós, projeto que enfrenta resistência de indígenas e ribeirinhos. "A medida teve um alvo claro: impedir as manifestações dos povos da floresta contra a construção de hidrelétricas em suas regiões e dos trabalhadores vítimas de superexploração por parte dos consórcios construtores das obras", defende Valente.

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), por sua vez, argumenta que a mudança "retirou das mãos dos estados a responsabilidade pela polícia ostensiva e preservação da ordem pública, nos locais em que os ministros entenderem ser mais conveniente a atuação de uma força controlada pelo governo federal". E ressalta que "esse contingente militar de repressão poderá ser usado contra populações afetadas pelas diversas obras de interesse do governo, que lutam pelo direito a serem ouvidas sobre os impactos desses projetos nas suas próprias vidas e no direito à existência digna, tal como já está ocorrendo com os ribeirinhos e indígenas do rio Tapajós".

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.