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Leonardo Sakamoto

A pessoa tem tempo para reclamar de manifestações. Mas não para propor algo novo

Leonardo Sakamoto

09/06/2013 13h26

Circulam pela internet reclamações sobre a falta de mobilização da sociedade visando ao que alguns chamam de "causas justas". Não raro, elas vêm carregadas de palavras de sabedoria como "Quando é para defender maconha, milhares de pessoas, mas para educação, esse bando de vagabundo não mexe uma palha" ou "Por que uma marcha de vadias (sic) junta tanta gente e uma contra a corrupção, não?"

É um tipo de voyeurismo maluco, um onanismo patológico, no qual a pessoa só consegue chegar ao orgasmo olhando os outros e controlando como eles trepam. "Não, não, não! Quando fizerem sexo, é só 'papai e mamãe', hein!".

Alguns assuntos e grupos sociais conseguem atrair mais pessoas, seja pela urgência e magnetismo de seu tema, pela capacidade de manter um foco claro, pelo nível de mobilização dos interessados ou mesmo por outros elementos que não cabem aqui. O pessoal da Marcha da Maconha não tem culpa de alguns eventos reacionários, organizados no município de São Paulo nos últimos tempos, terem trazido às ruas gente suficiente para encher apenas algumas kombis.

Em suma: Acha algo importante? Gostaria de defender um ponto de vista? Tire esse traseiro gordo do sofá da sala, largue esse pacote de amendoim e proteste você mesmo.

"Ah, mas eu tentei fazer um movimento contra gays, mendigos e ciganos e fui censurado. Cadê a liberdade de expressão?" – pergunta um dodói. Cadê o Ministério Público que não abriu uma ação contra você, meu filho? – pergunto eu.

Ao povo que não quer ferir ninguém, sugestões: comece pela internet, encontrando um grupo de amigos ou mesmo de desconhecidos que compartilhem a sua opinião ou descontentamento. Organizem uma comunidade, encontrem-se para discutir frente a frente, quando possível. Reservem momentos para a formação do grupo sobre o tema, on line ou in loco. Daí em diante, entrem em contato com lideranças políticas, sociais e econômicas que podem influenciar a realidade sobre a qual você quer uma mudança. Faça propostas, discuta caminhos, cobre atitudes e ética. Fiscalize. Monitore. Se necessário, crie uma entidade jurídica para ajudar nesses processos ou faça parte de uma existente. Se não for numericamente relevante para um ato público, dialogue com outras iniciativas que possuem conexões com o que defende. Saia do armário da inação.

Aí vem as injustificáveis justificativas falta de idade, de recursos, de empolgação, de redes de conhecidos. De coragem.

Mas tempo para ir no boteco tomar uma e reclamar daqueles que estão fazendo algo, as pessoas têm. Ah, se têm.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.