Regulamentação do lobby: ignorar uma unha encravada não a faz desaparecer
Lobby existe e sempre existiu. Faz parte do jogo democrático que grupos de interesse articulem politicamente, através do diálogo ou da pressão, com governos e parlamentos pela mudança ou manutenção de leis ou a execução de ações que beneficiem seus representados. A realidade é a resultante desses diferentes vetores de interesse. Que não possuem a mesma força, é claro. Mas isso já é outra história.
Quem anda pelos corredores do Congresso Nacional tropeça com lobistas de um lado para o outro. Conjuntos comerciais na capital federal são disputados a tapa por entidades e associações cujo objetivo é agir junto aos senhores e senhoras deputados e senadores – além de membros da administração pública federal. Até aí, nada de novo.
Mas como o lobby, em tese, não existe, cada um recebe quem quer, da forma que achar melhor, promete a mãe em troca de apoio para reeleição, sem prestar contas à sociedade, na surdina. Projetos e discussões para regulamentar a atividade no Brasil, alguns beirando o ridículo de se fazer apenas um cadastro e uma carteirinha para identificar o profissional envolvido, foram apresentados.
Fazer um crachá é uma solução tão boa quanto montar uma comissão. E, como sabemos, o Brasil adora um crachá. E uma comissão.
Regulamentar o lobby e a profissão de lobista significa dizer o que se pode e o que não se pode fazer. E estipular formas de publicizar obrigatoriamente essas ações. Em outras palavras, dar transparência.
Um lobista do setor sucroalcooleiro visitou o ministro da Agricultura? Que seja colocada na página do ministério o motivo da reunião, os presentes e o que foi discutido.
Um lobista do setor de rádio e TV ou da área de telecomunicações foi tomar chá com biscoitos com o ministro das Comunicações? Que fique claro quando tempo durou e o que foi discutido no encontro além do sabor dos amanteigados.
Um outro do setor automobilístico conversou com um presidente de comissão da Câmara dos Deputados? Idem: quem, quando, como, onde, o que, por que e com quem disponíveis no site do parlamento.
E se alguém não publicar a informação estará incorrendo em falta grave, passível de punição à empresa ou grupo representados.
Hoje, há um entra e sai tão grande de associações nos gabinetes que a única diferença entre o público e o privado é que um é uma palavra proparoxítona e o outro não.
E isso valeria para todos os setores: empresas, associações, sindicatos, movimentos sociais, organizações não-governamentais… Afinal, é nosso interesse que está envolvido e os políticos eleitos com nossos votos e os servidores públicos não têm direito de guardar sigilo sobre isso. Se países, como os Estados Unidos, têm regras específicas sobre o tema, por que nós não?
Quem já assistiu ao filme "Obrigado por fumar" (Thank You for Smoking, 2006), que satiriza a indústria do tabaco e as associações de lobby que atuam nos Estados Unidos, sabe o que é o discurso da defesa do indefensável. Mas aquilo, pelo menos, é público. Aqui dizemos que não existe tal situação. Besteira. Tende a ser pior. No Brasil, por exemplo, o lobby dos agrotóxicos joga bem pesado. Daria uma filme ou novela tão engraçados e trágicos quanto o da indústria do tabaco. O problema seria encontrar um patrocinador.
Ignorar que uma unha espeta a carne, escondendo-a sob a meia e o sapato, não faz ela desencravar. Pelo contrário. Infecciona.
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