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Leonardo Sakamoto

Em Curitiba, construção civil e comércio não gostam da Consciência Negra

Leonardo Sakamoto

20/11/2013 09h09

Hoje é dia da Consciência Negra em muitos municípios do país.

Mas não em Curitiba, capital do Paraná.

Porque os sindicatos dos patrões da construção civil e do comércio conseguiram revogar o feriado.

E o Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal confirmaram.

Não há negros nas diretorias da Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná e da Associação Comercial do Paraná, como informaram suas próprias assessorias, de acordo com boa reportagem de Rafael Martins, do UOL. O Tribunal de Justiça do Paraná não soube informar quantos dos seus 120 desembargadores são negros. Já o STF tem apenas um.

Os brancos são minoria no país, de acordo com o IBGE.

Os trabalhadores da construção civil têm rendimentos menores e jornadas de trabalho mais extensas do que média dos outros trabalhadores no Brasil, de acordo com o Dieese. Uma pesquisa feita nas regiões metropolitanas apontou que negros recebem 69,6% da remuneração dos não negros na construção civil e 68,3% no comércio.

O 20 de novembro, quando se rememora a vida e morte de Zumbi dos Palmares, mas também a de sua companheira, Dandara, deveria ser um momento de reflexão e de resistência sobre os frutos da escravidão e de um 13 de maio incompleto, que significou mais uma mudança na metodologia de exploração da força de trabalho do que a garantia da dignidade de fato. Dia que deveria ser aproveitado por todos aqueles que têm seus direitos fundamentais rasgados para uma análise mais profunda do que têm feito para sair de sua condição de gado.

Menos em Curitiba.

Pois, para muita gente, só o trabalho liberta.

Tinha que ser preto mesmo! Preto quando não faz na entrada faz na saída. Sabe quando preto toma laranjada? Quando rola briga na feira. Amor, fecha rápido o vidro que tá vindo um escurinho mal encarado. Olha, meu filho, não sou preconceituoso, não. Até tenho amigos negros.Ouviu aquele batuque? É um terreiro de macumba. Logo aqui na nossa rua! Mas o João Vítor vai dar um jeito nisso, ele conhece uma pessoa na subprefeitura que vai tirar essa gente daí. Essas coisas do diabo me dão arrepios. Eu adoro o Brasil porque é um país onde não existe racismo como nos Estados Unidos. Aqui, brancos e negros vivem em harmonia. Todos com as mesmas oportunidades e desfrutando dos mesmos direitos. Se eu deixaria minha filha casar-se com um negro? Claro! Se ela conhecer um, poderá sem sombra de dúvida. Tá tão difícil encontrar uma empregada decente ultimamente. Ainda bem que achei a Maria. Ela é de cor, mas super honesta. Quilombolas são pessoas indolentes. Erra o governo ao mantê-los naquele estado de selvageria.
 A terra poderia estar sendo usada para produzir algo, sabe? Ainda mais com tanta gente vivendo apertada em favelas! É o Brasil… Vê se me entende que eu vou explicar uma vez só. A política de cotas é perigosa e ruim para os próprios negros, pois passarão a se sentir discriminados na sociedade – fato que não ocorre hoje. Ele é um exemplo. É negro e, mesmo assim, virou ministro do Supremo Tribunal Federal sem ajuda de ninguém. Cotas ameaçam o princípio de que todos são iguais perante a lei, o que temos conseguido cumprir, apesar das adversidades. Meu filho não vai fazer um projeto de escola sobre coisas da África. A gente é evangélico e queremos que ele leia a bíblia e não esses satanismos como… como…como era o nome daquele livro mesmo que a professora passou? Sim! Macunaíma.

Refletir para quê? O Brasil não é preconceituoso.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.