Caso Levy: A diferença entre emitir opinião e proferir discurso de ódio
Responderei, hoje, à mensagem educadérrima e super chique do leitor Wagner:
Wagner, assim como você, muita gente na internet também confunde opinião com discurso de ódio.
Mas, olha, fique tranquilo. É um erro bem comum quando você não está acostumado às regras do debate público de ideias.
Na internet, o anonimato traz aquela sensação quentinha de segurança e, por conta disso, não raro, as pessoas extrapolam. Afinal de contas, por aqui é menos simples (mas não impossível) identificar quem falou a abobrinha.
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Então, vamos por partes. O direito ao livre exercício de pensamento e o direito à liberdade de expressão são garantidos pela Constituição e pelos tratados internacionais que o país assinou.
Mas, da mesma forma, as pessoas também são livres para ter sua orientação sexual. Isso sem contar o direito de ver preservada a sua integridade física e psicológica.
Ou seja, o mesmo direito que Levy Fidelix tem de ter suas opiniões, as pessoas também têm de ver garantida sua dignidade.
Agora, algo importante que as pessoas não sabem: liberdade de expressão não é um direito fundamental absoluto. Porque não há direitos fundamentais absolutos. Nem o direito à vida é. Prova disso é o direito à legítima defesa.
Pois a partir do momento em que alguém abusa de sua liberdade de expressão, indo além de expor a sua opinião, espalhando o ódio e incitando à violência, isso pode trazer consequências mais graves à vida de outras pessoas.
Como já disse aqui, pessoas como Levy Fidelix dizem que não incitam a violência. Não é a mão delas que segura a faca ou o revólver, mas é a sobreposicão de seus discursos ao longo do tempo que distorce o mundo e torna o ato de esfaquear, atirar e atacar banais. Ou, melhor dizendo, "necessários", quase um pedido do céu. São pessoas como ele que alimentam lentamente a intolerância, que depois será consumida pelos malucos que fazem o serviço sujo.
E o candidato foi bem claro em sua argumentação. Depois de humilhar homossexuais, afirmou: "Vamos ter coragem! Nós somos maioria! Vamos enfrentar essa minoria. Vamos enfrentá-los". Caberia bem em um filme sobre as Cruzadas ou a Inquisição, mas não em um debate presidencial.
A solução é garantir uma convivência pacífica e educada das diferenças. O ideal seria ir além da tolerância, com as pessoas enxergando essas diferenças como uma coisa boa para termos uma sociedade mais plural e interessante. Porém, na atual impossibilidade disso, a tolerância já está de bom tamanho.
Mas, aí, temos uma informação importante: a liberdade de expressão não admite censura prévia. Ou seja, apesar de alguns juízes não entenderem isso e darem sentenças aqui e ali para calar de antemão biografias, reportagens, propagandas, movimentos sociais, a lei garante que as pessoas não sejam proibidas de dizer o que pensam.
E foi isso o que aconteceu. Levy quis falar, Levy falou. A Record, acertadamente, não cortou seu microfone.
Contudo, há o outro lado da moeda: as pessoas são sim responsáveis pelo impacto que a divulgação de suas opiniões causam. Como foi o caso de dirigir a um grupo específico (homossexuais) um sentimento de ódio, propondo a restrição de seus direitos e até sua extirpação social. E toda pessoa que emitir um discurso de ódio, está sujeita a sofrer as consequências: pagar uma indenização, ir para a cadeia, perder o emprego, ter sua candidatura cassada.
Afinal, o exercício das liberdades pressupõe responsabilidade. Quem não consegue conviver com isso, não deveria nem fazer parte do debate público, recolhendo-se junto com sua raiva e ódio ao seu cantinho.
Por fim, a responsabilidade por uma declaração é diretamente proporcional ao poder de difusão dessa mensagem. Quanto mais pública a figura, mais responsável ela deve ser. Quanto maior o megafone (no caso de Levy, foi a segunda maior emissora de TV do país), mais responsável ela deve ser.
Certamente há outros candidatos e candidatas que não concordam com a justa equidade de direitos entre heterossexuais e homossexuais. Mas, apesar disso, nenhum deles descarregou essa opinião para o telespectador. Não dessa forma. Isso não é sinal de covardia dos outros. É sinal de estupidez de Levy.
Ou seja, o problema não é ter opinião. Muito menos declará-la. E sim como você faz isso. De forma respeitosa ou agressiva? Privilegiando o diálogo de diferentes e buscando uma convivência pacífica, ou conclamando as pessoas para desrespeitar ainda mais aqueles vistos como diferentes por medo ou desconhecimento?
Tenho a certeza de que se o combate ao discurso de ódio gerar a cassação de uma candidatura, estaremos passando para um outro patamar de civilidade no país.
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