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Leonardo Sakamoto

Estranhou os deputados mais votados em SP e no RJ? É a TV, estúpido!

Leonardo Sakamoto

06/10/2014 09h04

Os três primeiros colocados para a eleição de deputado federal em São Paulo – Celso Russomanno (7,26% do total de votos), Tiririca (4,84%) e Marco Feliciano (1,90%) – bem como os três do Rio de Janeiro – Jair Bolsonaro (6,10%), Clarissa Garotinho (4,40%) e Eduardo Cunha (3,06%) – têm uma característica em comum: sabem se beneficiar da exposição midiática.

Parte deles fez sua carreira na mídia e a outra conseguiu entender a lógica da cobertura política e, produzindo factóides, surfou nessa lógica, mantendo-se constantemente em evidência em seus mandatos.

Discordo das avaliações de que eles foram os primeiros apenas por conta de suas pautas conservadoras. O conservadorismo está presente nas bancadas paulista e carioca (e não é de hoje e nem apenas em partidos ditos de "direita"), mas não é elemento suficiente para explicar essas expressivas votações. Até porque há outros representantes do pensamento reacionário que foram candidatos, alguns deles com mais profundidade ou legitimidade em suas defesas, inclusive.

Estes, em especial, souberam criar narrativas que são um prato cheio para nós, jornalistas, ávidos por registrar e transmitir discursos que, por fugir do que acreditamos ser a forma tradicional de fazer política, chamam a atenção e produzem audiência.

Tanto que a lógica opera de ambos os lados. Jean Wyllys, o jornalista e professor, que até então era conhecido por ganhar uma das edições do Big Brother, eleito, em 2010, graças aos votos recebidos por Chico Alencar, tornou-se o sétimo deputado federal mais votado do Rio de Janeiro (1,90%), nestas eleições, por conta de uma intensa atuação em defesa de minorias e dos direitos humanos na Câmara dos Deputados. Ao adotar as pautas consideradas polêmicas por outros e ser um necessário contraponto a políticos como Bolsonaro e Feliciano, conquistou um espaço importante na mídia.

(Um parênteses: se a TV ajudou bastante na exposição de Jean, ela, contudo, não foi sua principal eleitora e sim a internet. E, acredito, o mesmo se aplique a Jair Bolsonaro. Ou seja, o tamanho da votação de parlamentares relacionados à pauta dos direitos humanos, para um lado ou para o outro, esteve diretamente relacionado ao "patrimônio" criado nas redes sociais no dia a dia de sua atuação no Congresso e durante a campanha.)

Tiririca seguiu sendo um voto de protesto. Mas esse posto não é novo, sempre foi ocupado por alguém. E, normalmente, uma figura que tenha se tornado conhecido pela TV. Pois antes do personagem interpretado por Francisco Everardo Oliveira Silva, tivemos Enéas Carneiro, conhecido pela defesa caricatural de propostas conservadoras nas eleições presidenciais de 1989, 1994 e 1998. Esse "capital de imagem de TV" acumulado possibilitou que ele fosse eleito deputado federal, em 2002, com 1,54 milhão de votos – até hoje a maior votação de um deputado no Brasil.

Isso prova que as bancadas desses estados não eram conservadoras ou não ficaram mais conservadores após esta eleição? Não, de maneira alguma. Apenas que não foi essa a única razão que gerou esses campeões de votos, talvez nem a principal, e que a mídia tradicional continua uma eleitora muito forte, construtora (e demolidora) de marcas e reputações.

É claro que veículos de comunicação são empresas e empresas têm suas preferências. Algumas delas deixam isso claro diariamente, outras nem tanto. O fato é que essas preferências editoriais também criam espaços para quem carrega determinados discursos e sabe reconhecer uma boa oportunidade de crescer. Ou seja, quem tem competência midiática vai mais longe.

Ou parafraseando a icônica expressão do assessor de Bill Clinton na campanha presidencial de 1992: É a TV, estúpido!

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.