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Leonardo Sakamoto

Dez dicas para viver com menos de um litro de água por dia

Leonardo Sakamoto

15/01/2015 17h51

Inspirado no grande Iberê Thenório, do Manual do Mundo, que mostrou como lavar um carro com menos de um copo de água e como gastar muito pouco no chuveiro, trago dez dicas para se viver com menos de um litro de água por dia. Agrupei técnicas milenares sobre as quais já havia rabiscado algumas linhas aqui e listo as recomendações – porque 2015 promete ser um ano com torneiras em crise de identidade em São Paulo.

Sugiro que imprimam a lista, uma vez que o racionamento de energia elétrica também desponta no horizonte.

1) Não troque de roupas diariamente. Só porque seu filho vomitou na sua camisa, isso vai impedi-lo de usá-la novamente no dia seguinte? E o espírito cívico, como fica? Em um mundo em que o Cheetos bolinha está universalizado, o que é mais um cheirinho azedo no escritório? Uma dica: se estiver fazendo muito calor, não transpire.

2) Um carro bem sujo, com aquela cara de abandonado há meses em pátio de Detran, criando cracas e ninhos de João de Barro, espanta os bandidos e, de quebra, afasta o olho gordo da vizinhança. E bike suja é bike de luta. Uma magrela cheia de lama, folhas e cara de surrada é símbolo de "statis" no movimento.

3) Passar pano úmido na casa é so last week. A moda agora é retrô: as vassouras voltaram com tudo. De piaçava, de pelo e até a ecologicamente correta de garrafa pet reciclada.

4) Flores secas são lindas e singelas. Muitos conseguem achar beleza em um buquê de rosas, um grupo de girassóis ou uma frondosa orquídea, que necessitam de água nova todo o dia. Mas flores secas não são para qualquer um e sim para quem sabe apreciar a imortalidade. Tal qual os faraós no Egito embalsamavam-se para a vida eterna, flores secas em cima da mesa nos mostram que algumas coisas podem durar para sempre.

5) Limpar pratos e copos sem água é um sucesso. Com um pouco de boa vontade, você consegue deixa-los com aparência de limpos só com papel toalha. Sem contar que deixa de lado o maldito detergente, que agride a pobre natureza.

6) Cabelo raspado está em alta. Você sabe quanto gasta com xampu, condicionador, modelador, fixador, hidratantes e afins mensalmente? Pois é, sem contar o tempo para lavar e secar a juba. Quem nunca pagou o mico de voltar com o cabelo molhado para o escritório após um almoço executivo que atire a primeira pedra. Cabeças são bonitas e têm que ser mostradas – menos a minha, que é um desbunde de tão grande.

7) Dar descarga, para quê? Deixar juntar é o que há. Estudos apontam que, em breve, as privadas sairão de fábrica com uma linha entre o nível da água e a tampa para mostrar a partir de que momento o acionamento da descarga é necessário por recomendação da saúde pública. Antes disso, bom ar resolve.

8) Gourmet mesmo não é quem toma o café. É quem come o pó.

9) Todo ser humano precisa beber muita água diariamente, principalmente no calor. Mas ninguém diz que a água não pode vir junto com outra coisa, não é mesmo? Refrigerantes, sucos de caixinha e bebidas lácteas (para quem não tem intolerância, claro) podem suprir isso. Pelo menos até o momento em que os dentes não aguentarem e começarem a cair. Mas, até lá, espera-se que os reservatórios estejam em melhor situação, o governo finalmente construa o sistema de armazenagem de São Lourenço ou o aquecimento global se reverta.

10) Em alguns casos, o uso de água se fará necessário, daí o tal litro supracitado no título. Para isso, a sugestão é começar a armazenagem desde já. Se tiver casa, com uma cisterna no quintal; se morar em apartamento, com alguns barris de água na área de serviço. Eu sei, esta última é a mais sem graça. Porque é a dica mais sincera para este momento.

E se acreditarem em algo sobrenatural, esta é a hora de pedirem ajuda.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.