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Leonardo Sakamoto

Por que defender apenas embriões? Proponho já o Estatuto do Espermatozoide

Leonardo Sakamoto

12/02/2015 16h36

Uma ofensiva de parlamentares ligados a grupos religiosos conseguiu trazer novamente às discussões da Câmara dos Deputados o projeto do Estatuto do Nascituro.

Ele prevê o direito ao pagamento de pensão pelo Estado às crianças concebidas através de estupro caso o pai (vulgo, o estuprador) não puder arcar com isso ou não for identificado, entre outros pontos polêmicos.

O texto original (que teve um substitutivo aprovado, em 2013) cria brechas para criminalizar o aborto em casos já previstos, como o de estupro. Na prática, o embrião passaria a ter mais direitos que a mulher violentada. Seria menos hipócrita formalizar os indivíduos XX como vasos de plantas.

Mas por que parar só com um Estatuto do Nascituro? Os "homens e mulheres de bem" merecem que a família e os bons costumes sejam resguardados. E a vida protegida acima de tudo.

Então, com base no projeto original do Estatuto do Nascituro, proposto por Luiz Bassuma (PT-BA) e Miguel Martini (PHS-MG), este blog quer algo mais ousado: O Estatuto do Espermatozoide. Ele vai evitar, de uma vez por todas, que a vida – mesmo em seu caráter ainda potencial – seja desperdiçada diariamente como é feito em todos os rincões do país em nome de um questionável e breve momento de luxúria. Pois cada um é uma vida que vai pelo cano ou pro lixo.

Exagero? Não. Como é a frase que ouvi de um pastor dias desses… Ah, sim, claro: Deus me pediu para fazer isso.

PROJETO DE LEI QUE DISPÕE SOBRE O ESTATUTO DO ESPERMATOZOIDE E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS

O Congresso Nacional decreta:

Das disposições preliminares

Art.1o Esta lei dispõe sobre a proteção integral ao espermatozoide.

Art. 2o Espermatozoide é parte de um ser humano a ser concebido, mas ainda não concebido e nem nascido.

Parágrafo único. O conceito de espermatozoide inclui os potenciais seres humanos concebidos "in vitro", os produzidos através de clonagem, através do rompimento de preservativos, masturbação periódica ou pontual ou por outro meio ética e esteticamente aceito.

Art. 3o O espermatozoide adquire personalidade jurídica ao deixar o canal uretal, mas sua natureza humana é reconhecida desde o testículo, conferindo-lhe proteção jurídica através deste estatuto e da lei civil e penal.

Parágrafo único. O espermatozoide, sem trocadilhos, goza da expectativa do direito à vida, à integridade física, à honra, à imagem e de todos os demais direitos da personalidade.

Art. 4o É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar ao espermatozoide, com absoluta prioridade, a expectativa do direito à mobilidade, à vida, à saúde, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência com seus irmãos espermatozoides, além de colocá-lo a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Dos direitos fundamentais

Art. 5o O espermatozoide deve ser objeto de políticas públicas que permitam seu desenvolvimento sadio e harmonioso e o sua eclosão, em condições dignas de existência.

Art. 6o Ao espermatozoide é assegurado, através do Sistema Único de Saúde – SUS, o atendimento em igualdade de condições com a criança.

Art.7o É vedado ao Estado e aos particulares discriminar o espermatozoide, privando-o da expectativa de algum direito, em razão do sexo, da idade, da etnia, da origem, de deficiência física ou de locomoção ou da probabilidade de sobrevida.

Art. 8o É vedado ao Estado e aos particulares causar qualquer dano ao espermatozóide em razão de um ato delituoso ou prazeroso cometido por algum de seus genitores.

Art. 9o O espermatozoide utilizado em ato de violência sexual não sofrerá qualquer discriminação ou restrição de direitos, assegurando-lhe, ainda, os seguintes:

I – direito prioritário à assistência, com acompanhamento psicológico; II – direito a pensão alimentícia equivalente a 1 (um) salário mínimo; III – direito prioritário à adoção, caso ninguém queira assumir o espermatozoide .

Parágrafo único. Se for identificado o responsável pelo espermatozoide, será ele a cargo da pensão alimentícia a que se refere o inciso II deste artigo; se não for identificado, ou se for insolvente, a obrigação recairá sobre o Estado.

Art. 10 Sempre que, no exercício do poder familiar, colidir o interesse dos pais com o do espermatozoide, o Ministério Público requererá ao juiz que dê ao espermatozoide um tutor especial.

Art. 11 Dar-se-á tutor ao espermatozoide, se o pai falecer estando grávida a mulher, e não tendo o poder familiar.

Parágrafo único. Se a mulher estiver interdita, seu tutor será o do espermatozoide.

Art. 12 O espermatozoide será representado em juízo, ativa e passivamente, por quem exerça o poder familiar, ou por tutor especial.

Art. 13 Os danos materiais ou morais sofridos pelo espermatozoide ensejam reparação civil.

Dos crimes em espécie

Art. 14 Cometer genocídio através da masturbação por prazer e sem fins de procriação. Pena – detenção de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos.

– 1o A pena é aumentada de um terço de for utilizado material pornográfico impresso ou digital no ato do genocídio ou se a mastrubação envolver duas pessoas do mesmo sexo ou uma pessoa e um animal doméstico ou selvagem ou uma pessoa e uma árvore frutífera.

Art. 15 Causar culposamente a morte de um espermatozoide. Pena – detenção de 1 (um) a 3 (três) anos.

– 1o A pena é aumentada de um terço se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro ao espermatozoide, não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante.

– 2o O Juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. O profissional de sexo envolvido não poderá alegar, portanto, desconhecimento.

Art. 16 Congelar, manipular ou utilizar espermatozoide como material de experimentação: Pena – Detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.

Art. 17 Referir-se ao espermatozoide com palavras ou expressões manifestamente depreciativas, como porra: Pena – Detenção de 1 (um) a 6 (seis) meses e multa.

Art. 18 Exibir ou veicular, por qualquer meio de comunicação, informações ou imagens depreciativas ou injuriosas ao espermatozoide: Pena – Detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

Art. 19 Fazer publicamente apologia à morte de espermatozoides ou de quem a praticou, ou incitar publicamente a sua prática: Pena – Detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

Art. 20 Usar espermicida configura-se ataque envolvendo armas químicas de destruição em massa e, portanto, crime contra os direitos humanos. Pena – detenção de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos.

***

E olha que não deu nem 15 dias de Eduardo Cunha na presidência da Câmara. Outros projetos que devem voltar a andar são: o que proíbe a adoção de crianças por casais do mesmo sexo; o que cria o Dia do Orgulho Hétero (um amigo, jornalista e ativista LGBTT, pede para avisar que isso é tão gay que seria divertido, se não fosse trágico); e uma lei que proíbe a discriminação contra heterossexuais.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.