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Leonardo Sakamoto

PSOL suspende deputado federal por atentar contra Estado laico

Leonardo Sakamoto

26/03/2015 17h37

A executiva nacional do PSOL suspendeu, nesta quinta (26), o deputado federal Cabo Daciolo (RJ), encaminhando ao diretório nacional a decisão sobre sua permanência no partido. A partir de agora, ele não poderá fazer aparições públicas ou falar em nome do PSOL e estará sujeito à Comissão de Ética do partido, que analisará se ele incorreu em "infidelidade partidária".

O motivo, segundo nota divulgada pela executiva, foi a apresentação de uma proposta de emenda constitucional que pretende mudar o artigo 1o da Constituição Nacional. De "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente" passaríamos para "Todo poder emana de Deus" – se o pedido do deputado, que é evangélico e cabo do Corpo de Bombeiros, for atendido. Segundo o partido, isso desfaz a garantia de um Estado laico e pode abrir caminho para outras mudanças na legislação.

Daciolo já havia ameaçado antes propor essa ideia genial, mas havia sido demovido pelos colegas de bancada e a direção do partido.

"O PSOL agrega em suas fileiras incontáveis filiados, dirigentes e parlamentares que professam alguma fé religiosa. Todos estes são sempre bem vindos e não tem no partido qualquer restrição em relação às suas opções religiosas. Contudo, exige-se no partido a atuação política respeitando-se a separação entre religião e Estado", afirma a nota divulgada, nesta quinta (26), pelo partido.

A executiva nacional do PSOL também afirma que o deputado federal decidiu defender os policiais militares acusados da morte do pedreiro Amarildo, caso de repercussão internacional a partir do Rio de Janeiro.

"O deputado Daciolo teria e tem todo o direito e dever de defender um julgamento justo e célere aos policiais acusados neste e noutros casos, pois todos estes são detentores de plenos direitos e do devido processo legal. Mas é inadmissível ao PSOL a defesa, por parte de um de seus membros, de que estes são inocentes e que os culpados seriam outros", diz a nota. "Não está em discussão o direito elementar de defesa de todos os acusados, mas não cabe ao partido transmitir dubiedade sobre a necessária punição dos responsáveis pelos crimes contra o povo pobre."

Daciolo, em discurso nesta quarta, afirmou: "eu venho decretar aqui agora, deixar em alto e bom som, que verdadeiramente, na minha opinião, todo poder emana de Deus, que o exerce de forma direta e também através do povo. E que hoje estou colocando esta PEC em andamento. As assinaturas estão aqui, e eu quero é dialogar. Peço por gentileza que o PSOL dialogue comigo. Juntos somos fortes, nenhum passo daremos atrás, Deus está no controle".

A reunião do Diretório Nacional do partido deve ocorrer em meados de maio, quando será discutida a expulsão de Daciolo, que terá direito à defesa.

O partido, que possui cinco deputados federais, não decidiu se, uma vez ratificada a expulsão, reivindicaria a vaga do cabo. O blog não conseguiu contato com Daciolo até a publicação deste texto.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.