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Leonardo Sakamoto

Taxistas vs Uber: Chegamos ao momento de chantagem com morte?

Leonardo Sakamoto

19/06/2015 13h25

Taxistas, como qualquer outra categoria de trabalhadores, devem reivindicar seus direitos sempre que se sentirem prejudicados. Mas isso não dá a suas lideranças o poder de fazer declarações que soam como chantagens e ameaças veladas aos habitantes de uma cidade como São Paulo.

Matéria na Folha de S.Paulo, desta sexta (19), traz declarações de Antônio Raimundo Matias dos Santos, presidente do Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores nas Empresas de Táxis de São Paulo, proferidas em audiência na Câmara dos Deputados para discutir a regulamentação do aplicativo Uber. "Não temos como conter a categoria" e "vai ter morte" foram alguns dos "avisos" ouvidos.

O que foi confirmado por Natalício Bezerra, presidente do Sindicato dos Taxistas Autônomos de São Paulo: "Pode ocorrer sim uma desgraça porque os motoristas estão revoltados. Um grupo veio falar comigo para dizer que, se a lei não fiscalizar esses clandestinos, eles vão tomar uma atitude".

Sou, particularmente, a favor do Uber, um dos aplicativos que possibilita acesso a motoristas que fazem corridas particulares. Ainda mais em uma cidade como São Paulo, com um baixo número de táxis por habitante em comparação a outras (a capital paulista tem frota um pouco maior que a do Rio de Janeiro, apesar de ostentar quase o dobro de habitantes) e entupida de veículos particulares que ficariam na garagem se houvesse mais opções confortáveis.

Que se regulamente as regras para o serviço e a arrecadação de impostos, desenvolva-se cursos especiais para os motoristas, garanta-se normas para a segurança de passageiros, enfim, traga a novidade para dentro do sistema. Proibir é que não faz sentido algum – além da lógica da reserva de mercado, é claro.

Neste caso, lógica tão anacrônica quanto a obrigatoriedade de diploma para exercer o jornalismo.

Esse debate, contudo, deve ser feito de forma pacífica, levando em conta todos os posicionamentos, incluindo taxistas e motoristas particulares. E o ambiente democrático não pode admitir ameaças ou chantagens. Ainda mais envolvendo mortes.

Se cada sindicato de trabalhadores ou associação patronal avisar que ou as coisas serão do jeito deles ou vai ter morte, decretamos a falência do diálogo, da sociedade, do Estado.

Para ser honesto, isso acontece há tempos com algumas entidades que organizam fazendeiros, principalmente na Amazônia, e cantam a bola de corpos antes das lideranças rurais aparecerem mortas no mato, aqui e ali.

Eles não são fazendeiros que produzem para o desenvolvimento do país e para alimentar a população. São criminosos.

Da mesma forma que não serão taxistas que utilizarão de violência contra motoristas ou passageiros de outras formas de transporte para resolver sus problemas. Serão criminosos. Que deverão ser julgados como tal, sem direito a nenhum atenuante.

E caso uma entidade de classe passe a defender esse tipo de posicionamento abertamente ("ou o mundo para de mudar ou pessoas vão morrer") deverá ser corresponsabilizada pelos atos de seus associados.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.