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Leonardo Sakamoto

Odiar é fácil, qualquer fuinha odeia. Dialogar tem sido para poucos

Leonardo Sakamoto

12/07/2015 12h50

A esquerda foi para a rua na redemocratização do país e não saiu mais. Não pode se assustar, portanto, que a direita também esteja ocupando o espaço público. Pelo contrário, deveria achar isso saudável.

A histórica ausência de debate político nas ruas, criou alguns problemas. Por exemplo, a incapacidade de muita gente de separar o que é um discurso conservador (que tem suas pautas a respeito do papel do Estado) e os dodóis que, em número insuficiente para organizarem suas próprias manifestações, tentam empurrar um ato de terceiros para o fundo do poço com suas ideias que – não raro – vão contra a dignidade e a legalidade.

Se você acha que não dá para separar esses dois grupos: os conservadores e os dodóis, é porque precisa sair mais à rua.

Isto não é inédito aqui no blog, mas achei que valia o resgate.

A fuinha (Martes foina) é um mamífero carnívoro, que mede entre 40 a 50 cm, com cerca de 25 cm de cauda e pesando entre 1,1 e 2,5 kg, e não está em risco de extinção.

A fuinha (Martes foina) é um mamífero carnívoro, que mede entre 40 a 50 cm, com cerca de 25 cm de cauda e pesando entre 1,1 e 2,5 kg. Não está em risco de extinção.

No primeiro grupo, colocaria um senhor, muito simpático, com quem travei um rápido diálogo em uma livraria. Ele veio até mim, disse que discordava dos pontos de vista deste blog e travou um debate cordial sobre o papel do Estado no desenvolvimento e sobre algumas liberdades individuais. Foi duro na argumentação mas, ao mesmo tempo, polido. Esperou para ouvir minhas considerações, e educadamente, se despediu.

No segundo, incluiria uma senhora que, no domingo de segundo turno, parou seu carro diante de mim, gritou "Volta pra Cuba!", seguido de um elogio à minha progenitora, cuspiu em mim e saiu cantando pneu. Sorte que a mira dela era tão boa quanto o seu nível de cultura política.

Quanto mais a esquerda juntar esses dois grupos no mesmo balaio, mais eles vão se aproximar. Sei que PSDB e PT trouxeram muito lixo para perto de si como estratégia eleitoral (burra) e, agora, como diria Antoine de Saint-Exupéry, ambos são responsáveis por aquilo que seus marqueteiros cativaram. Mas eles também não são os demônios – apenas andaram invocando Bettle Juice vezes demais.

eternamente

Mas nós (de esquerda, principalmente a não partidária) também precisamos fazer essa distinção no dia a dia. Caso contrário, por identidade reativa, jogaremos no colo dos amantes do ódio uma parcela da sociedade que apenas discorda de nós do ponto de vista ideológico.

E é isso o que desejam os dodóis, que insistem em batizar algumas atitudes criminosas de "reivindicações conservadoras".

Pois uma coisa é um pensamento, que merece ser respeitado e, na minha opinião, questionado – quando for o caso – nas arenas de discussões. A outra é gente que acha que a Constituição é papel higiênico e as instituições democráticas – que levamos décadas para reconstruir – são um grande vaso sanitário de onde só exala fedor.

Reivindicações que incluem uma "intervenção militar constitucional" (haha), o bloqueio da transformação do país em uma "ditadura gayzista e feminazi (hahahaha) e uma ação para evitar a "implantação do comunismo" pelo partido que está no poder (kkkkkkkkkk…#morri). Em que país eles vivem?

Li, tempos atrás, um panfleto que dizia que o PT está rompendo com o capital, o que vai colocar o país em uma grave crise. Sério? Para com isso… Dá vergonha alheia! Desde quando o PT ou qualquer partido grande cria entraves para bancos, empreiteiras, empresas de telefonia e demais doadores de campanha?

Se o PT fizesse isso, eu promoveria três dias e três noites de balada open bar lá na casa dos meus pais, no Campo Limpo – porque dá para fechar com lona a garagem, botar umas caixas de som e umas luzes (#quemnunca).

É fundamental que ultraconservadores continuem mostrando sua cara e dizendo quem é. Como já disse aqui em outro texto, você não está cansado de ser xingado por anônimos na internet? Não tem curiosidade de saber quem prega a violência contra minorias? O que comem? Como vivem? Como se acasalam?

Uma das maiores consequências das manifestações de junho de 2013 foi trazer pessoas para ocuparem espaços públicos e darem suas opiniões que, antes, estavam restritas aos espaços privados.

Ruas, praças e avenidas não são apenas rotas de passagem de pedestres e automóveis, mas é onde se faz política e se exerce a cidadania. Que nos dediquemos a fomentar a cultura política e não apenas chamar o outro de inimigo. E, aos dodóis que ultrapassarem os limites democráticos, de forma analógica ou digital, a força da lei.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.