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Leonardo Sakamoto

Por uma reforma ministerial que expurgue as aberrações

Leonardo Sakamoto

29/09/2015 15h45

O Palácio do Planalto discute unir as secretarias especiais de Direitos Humanos, Políticas para as Mulheres e Igualdade Racial, todas hoje com status de ministério, em um único Ministério da Cidadania. E, ao mesmo tempo, rebaixar a Secretaria Nacional de Inspeção do Trabalho, alocando-a em alguma diretoria com menos poder, quando o ministério da Previdência Social fagocitar o do Trabalho e Emprego.

Sou particularmente a favor de uma reforma ministerial. Uma reforma que expurgue aberrações políticas – vazias de conhecimento técnico, mas recheadas de interesses econômicos – plantadas na Esplanada em nome da governabilidade, do apadrinhamento e do atendimento nonsense a algumas correntes partidárias.

Até sou a favor de uma redução no número de ministérios. Não pela economia que a ação geraria – que não seria significativa se não fosse precedida de uma reforma administrativa e política que jogasse Pinho Sol e creolina em certas instituições federais. Mas ajudaria a racionalizar a gestão. O problema é que governos agem como algumas empresas familiares: quando nasce mais um filho (no caso, partido de base aliada), cria-se algo para acomodá-lo, mesmo que não ajude a facilitar a administração o país.

Mas é incrível como a porrada vem sempre sobre as áreas que mais precisam de apoio político porque tratam da dignidade de rotos, rasgados, prostituídos e minorias em geral – o povo que a elite política e econômica está pouco se lixando. Essas secretarias, que não possuem orçamento significativo, usam de seu (pequeno) poder político dos ministros para fazer avançar pautas. Agora, o governo estuda uma mudança radical nessas pastas – afetando aquele pessoal que acreditou nas promessas eleitorais de mudanças econômicas sem sofrimento para o trabalhador – sem garantir que esse poder de influência aumente ou se mantenha.

Há mais de dez anos, um político ligado à área defendeu uma proposta de um ministério forte dos Direitos Humanos. Em sua concepção, juntando diferentes secretarias e outras instituições que precisavam de uma refundação, como a Funai, e contando com um orçamento muito maior, seria capaz de tornar essa área um ator de influência nos debates sobre desenvolvimento e economia.

Lembrando às pessoas que não costumam ler mais do que um tuíte de texto que "direitos humanos" envolvem seu direito à liberdade de expressão, a ter um trabalho digno e não ser escravizado, de não ser preso arbitrariamente na rua, a ter um nome e uma nacionalidade, a poder constituir um negócio ou professar uma fé, a não ser violentado pelo Estado, a poder ter infância, a de não ter medo de ser quem você nasceu para nascer, entre outras tantas coisas.

O erro do bem-aventurado político era que nenhuma administração, atual ou passada, garantiria condições de recursos humanos e financeiros para manter um ministério com essa função e esse poder de fogo. Não é prioridade.

Afinal de contas, a reforma, que está sendo feita agora é para tentar lançar uma boia de salvação ao governo que está se afogando e não para navegar o país para fora das águas turvas do pântano da dignidade – mais lodoso e antigo que a última tempestade econômica.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.