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Leonardo Sakamoto

Por uma eleição em que marqueteiros não sejam os protagonistas

Leonardo Sakamoto

23/02/2016 20h15

Em dias de marqueteiro preso, me peguei sonhando com uma campanha presidencial em que eles não sejam mais as figuras centrais, mas sim o debate das pautas de interesse público.

Uma campanha que não contasse com malabarismos de imagens, sons e edição, relatando mentiras sensacionais ou encobrindo fatos, de forma gloriosa e cintilante, para os eleitores. Campanhas com mais saliva dos candidatos e menos efeitos especiais.

No segundo turno das eleições presidenciais de 2014, era impossível saber o que era ficção e o que era realidade de ambos os lados da disputa. E com a guerra suja sendo travadas nas redes sociais, qualquer verdade sobrevivente resgatada pela imprensa ou sociedade civil automaticamente sofria bombardeio das campanhas, de seus robôs e da parcela de simpatizantes que, mordidos pelos marqueteiros e despidos de senso crítico, tornaram-se zumbis.

Torço para que o fim do financiamento empresarial de campanhas eleitorais torne impossível contratar marqueteiros que custam R$ 150 milhões.

Pois se o candidato ou candidata não forem fenômenos de arrecadação de pessoas físicas, será muito difícil justificar de onde veio tanto recurso para ter um campanha com nível de show internacional. E bastará uma olhada entre o nível da produção e a quantidade de doações para fazer com que alguém se torne alvo de investigação por caixa 2 do Ministério Público Federal.

O fim do financiamento empresarial para todos os partidos pode colocar um ponto final nesse processo que se retroalimenta. "Ah, a campanha do meu adversário está usando hologramas e realidades virtual 3D na campanha, então preciso ir além e escrever meu nome no céu das principais capitais com sal rosa do Himalaia."

Um lado alimenta a loucura do outro em uma competição em que centenas de milhões são gastos, muita gente de comunicação fica rica, empresas garantem facilidades futuras e ideias que não contam com apoio econômico são ignoradas.

Ou seja, quem mais perde hoje é quem deveria ganhar com eleições livres: a democracia.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.