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Leonardo Sakamoto

Chantagem ambiental

Leonardo Sakamoto

25/04/2007 22h44

O ministro das Minas e Energia, Silas Rondeau, disse, hoje, que ou o licenciamento ambiental das hidrelétricas do rio Madeira (Santo Antônio e Jirau) sai até maio ou o governo vai começar a procurar outras fontes de energia como a térmica ou nuclear.

Isso tem nome: chantagem. Do tipo: "ou libera o que quero ou consigo um jeito de atrapalhar ainda mais a sua vida". O interessante é que Rondeau não escolheu a energia eólica, a solar ou a proveniente da biomassa como opções, o que mostra o padrão de desenvolvimento que reina em seu pensamento.

O Nordeste é considerado uma das melhores jazidas de vento do planeta, com potencial suficiente para gerar 10 mil megawatts de energia elétrica a partir de usinas eólicas – potência equivalente ao que é produzido pelas hidrelétricas da região, mas sem inundar grandes áreas ou lançar resíduos tóxicos na atmosfera. Ventos constantes, não existência de fortes rajadas (garantindo a estabilidade das grandes turbinas) e a pequena turbulência – desgastando menos os equipamentos que na Europa ou nos Estados Unidos. Hoje, há apenas um gerador eólico instalado em Fernando de Noronha e um punhado deles em Fortaleza (CE). Uma "fazenda de vento" está sendo construída no Rio Grande do Sul, mas ainda é pouco.

Ao mesmo tempo, devido a fatores como a proximidade com o Equador e o céu limpo, sem nuvens, o Semi-árido nordestino possui mais de 3 mil horas anuais de brilho do sol – estimativa comparável às dos desertos da Austrália e da África. O problema de estar entre os quatro maiores índices de insolação do mundo pode ser revertido em benefício do país se o governo começasse a investir na produção de energia solar.

Dei o exemplo do Nordeste pois é uma região em que o crescimento econômico se faz mais necessário. Mas a introdução de usinas de energia limpa pode ser feita em todo o país. Se a tecnologia ainda é mais cara, ela certamente causará menos prejuízos às populações tradicionais do local do empreendimento ou ao meio ambiente.

Isso sem falar na conversão do bagaço, de queima mais limpa, em eletricidade, através da adaptação das usinas de cana já existentes. Ou seja, aproveitar resíduos para gerar energia. Esse processo está em curso, mas a passos lentos.

A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, respondeu ao seu colega através de uma entrevista na Globonews dizendo que tanto a energia térmica quanto a nuclear não são opções. Mas a culpa não é só de Rondeau. Ele cumpre um roteiro deixado pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que já foi titular da pasta e hoje tem a missão de botar nos trilhos o Plano de Aceleração do Crescimento.
Custe o que custar.

E, infelizmente, a população local é um custo barato comparado com o progresso do país…

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.