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Leonardo Sakamoto

E se os políticos brasileiros adotassem o harakiri?

Leonardo Sakamoto

28/05/2007 13h30

Nos meus anos de "nihongako" (aquela escola de japonês que os descendentes acabam sendo obrigados a fazer quando crianças), ouvi pela primeira vez falar do harakiri – o suicídio ritual realizado para evitar ou compensar a perda da honra da família devido a uma burrada que o sujeito fez. Uma espada é enfiada no ventre, rasgado em forma de cruz. Violento, mas esteticamente delicado.

Hoje, o ministro da Agricultura do Japão Toshikatsu Matsuola cometeu suicídio, não com uma lâmina afiada, mas através do enforcamento. A razão são os escândalos de corrupção e mau uso de recursos públicos em que estava envolvido.

O harakiri foi muito usado após a Segunda Guerra Mundial por militares que negaram a rendição por não agüentarem ver o império que não perdia uma guerra havia mais de 2 mil anos reduzido a cinzas. Ainda hoje, o ritual é praticado por diretores de multinacionais e outros altos postos. A discussão se isso é um ato de coragem ou de covardia é longa, por isso nem irei adentrar nessa seara.

No Brasil, o mais próximo disso talvez tenham sido os mergulhos para a morte feitos pelos investidores e barões do café do alto das sacadas de seus casarões na avenida Paulista, quando houve o crack da bolsa de Nova Iorque em 1929, e a cafeicultura viveu tempos de horror.

O que aconteceria se o harakiri fosse importado para os dias interessantes em que vivemos? Diante das sucessivas notícias sobre corrupção, temo que não haveria espadas (ou navalhas) suficientes para tantos empresários e políticos envolvidos nos escândalos. Só no período FHC-Lula tivemos, por exemplo, a compra de votos de congressistas para a emenda da reeleição, o dinheiro que rolou no processo de privatização de estatais, mensaleiros e sanguessugas.

Os suicídios em massa também causariam um impacto na economia: restaurantes finos de São Paulo e Brasília, onde negociatas são fechadas a vinhos e conhaques caros, fechariam as portas, além das lojas de artigos de luxo onde são vendidos mimos bancados com o dinheiro do contribuinte.

Mas, para isso, eles teriam que saber o que é vergonha e honra, o que está longe de acontecer.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.