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Leonardo Sakamoto

Trabalhador morre em unidade de frigorífico exportador no MT

Leonardo Sakamoto

25/02/2008 21h56

O trabalhador Claudio Freitas Cruz morreu na última quinta-feira (21) após um acidente enquanto manuseava um equipamento de solda na unidade de Alta Floresta (MT) do Frigorífico Quatro Marcos. O grupo, um dos maiores do país, é membro da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec).

Ele estava sem luvas, capacete e cinto de segurança, equipamentos de proteção individual que devem ser fornecidos obrigatoriamente pela empresa. A necropsia apontou que o choque não foi a causa da morte e sim a queda do local onde estava. Se tivesse o equipamento não teria caído e quebrado o pescoço.

Segundo testemunhas, Claudio – que deixa mulher e um filho de dois anos – reclamava sempre que a empresa não disponibilizava equipamentos de proteção sob a justificativa de contingenciamento de gastos. Esse não foi o primeiro acidente fatal no frigorífico: uma trabalhadora morreu ao ter o corpo puxado para dentro de uma máquina.

De acordo com o Ministério Público do Trabalho, o Quatro Marcos descumpre sistematicamente as normas de segurança e saúde do trabalhador. No dia 13 de dezembro, a empresa firmou um acordo com o MPT em que se comprometia a cumprir a legislação trabalhista e garantir segurança aos funcionários de suas seis unidades no Estado do Mato Grosso. Pelo acordo, o grupo garantiu que pagaria uma multa de R$ 2 milhões.

O setor de graxaria – parte da fábrica que transforma todos os resíduos do abate de aves, suínos ou bovinos em farinhas – concentra o maior número de acidentes de trabalho no Quatro Marcos de Vila Rica. Antes do acordo, o trabalho na graxaria chegava a se estender por 17 horas diárias, sem equipamentos de proteção, em um ambiente quente e barulhento. "Quando estamos trabalhando na graxaria, o cheiro de carne podre é insuportável fazendo com que alguns até passem mal", relataram os funcionários ao MPT. As fiscalizações também constataram que a alimentação fornecida aos trabalhadores era deficiente e composta por partes não comercializadas dos animais abatidos, como sebo, "vacina" (local onde o boi recebe a injeção) e refile (raspa do osso).

Em dezembro, as atividades da unidade de Vila Rica (MT) do frigorífico também foram suspensas por determinação da Justiça do Trabalho após um vazamento de gás intoxicar, ao menos, 14 pessoas. Quem inalou o produto, apresentou vômito e teve desmaios, dormência em várias partes do corpo, dificuldade de respiração e fraqueza.

O Brasil vira referência de produção de carne bovina, batendo recordes de vendas, mas não consegue garantir qualidade de vida a quem torna isso possível, lá na base. Ao contrário do que alguns espertinhos pensam, isso não é um bom negócio. Mais cedo ou mais tarde, o desrespeito à dignidade vai cobrar seu preço.

Talvez uma empresa possa sobreviver tentando burlar a lei. Mas, e sem clientes, por quanto tempo ela consegue agüentar?

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.