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Leonardo Sakamoto

Incra é acusado de trair trabalhadores e favorecer a Vale

Leonardo Sakamoto

21/08/2008 08h51

Segue nota divulgada, ontem, por associações de pequenos produtores rurais, sindicatos de trabalhadores rurais e pela Comissão Pastoral da Terra, em Ourilândia do Norte, Sul do Pará:

Os trabalhadores rurais assentados nos Projetos de Assentamento Campos Altos e Tucumã, nos Municípios de Ourilândia, Tucumã, São Félix do Xingu e Parauapebas, bem como suas organizações de apoio e assessoria, vem a público manifestar total indignação com a decisão do Presidente do INCRA, publicada no dia 11.08.08, que desafetou 7.300 hectares dos referidos Assentamentos, atendendo pedido da Mineração Onça Puma Ltda, Empresa do Grupo VALE.

Temos informações que a decisão do Presidente Rolf Hackbart foi tomada de forma unilateral, contra o posicionamento do Conselho Diretor do INCRA, que deveria ter sido consultado previamente. Tivemos informações de que o Presidente do INCRA foi pressionado pelo Planalto a agir assim, sob pena de perder o cargo. A Casa Civil teria exigido imediata decisão do INCRA em favor da VALE antes do presidente vir a Belém anunciar as obras de interesse da Empresa.

Com esta decisão o INCRA rompeu seu compromisso com os trabalhadores de negociar a assinatura de um Termo de Compromisso com a Mineradora antes de desafetar a área, o que prejudica muito os assentados. A decisão é uma demonstração de que, para o atual governo, o que está em primeiro lugar são os interesses do poder econômico que avança sobre a Amazônia em detrimento dos direitos das comunidades que aqui residem e da defesa do meio ambiente.

Além disso, manifestamo-nos também contra o estado de abandono em que se encontram as centenas de famílias assentadas pelo INCRA há mais de 10 anos nos Projetos de Assentamento parcialmente desafetados. Os impactos e prejuízos que já estão sofrendo desde 2003, praticamente inviabilizam a permanência dos mesmos. Até agora o INCRA não se manifestou sobre essa situação e nem se fala em indenização pelos prejuízos. Afinal, como o órgão gestor da Política de Reforma Agrária, o INCRA tem inegável responsabilidade com os trabalhadores assentados e não pode se eximir de assumir o seu papel.

Ademais com relação às famílias que foram pressionadas pela Mineradora a negociar suas benfeitorias, o INCRA mantém uma postura rígida no sentido de excluí-las sumariamente da Relação de Beneficiários (RB) e conseqüentemente do Programa de Reforma Agrária, eximindo-se de qualquer responsabilidade com o re-assentamento das mesmas. Isso é particularmente grave, considerando que, com sua conivência e omissão, o próprio INCRA contribuiu para agravar a vulnerabilidade das famílias face à pressão da Empresa para conseguir a negociação dos seus direitos de assentados.

Frente à situação exposta, as associações que representam os assentados, e as entidades que os apóiam, exigem que o INCRA assuma sua responsabilidade com os assentamentos e respeite os direitos das famílias assentadas. As referidas entidades vão continuar com a luta em defesa dos direitos dos trabalhadores, utilizando todos os meios legais possíveis para responsabilizar a Empresa VALE e o INCRA pelos danos causados às famílias.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.