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Leonardo Sakamoto

Heróis do Brasil

Leonardo Sakamoto

27/08/2008 23h33

Há alguns casos que podem ser considerados perdidos. O Grupo José Pessoa, que é uma força econômica na área de açúcar e álcool, infelizmente está se mostrando um deles.

Em 13 de novembro de 2007, o governo federal resgatou 1011 trabalhadores, a maior parte deles indígenas, em condições degradantes de serviço na fazenda e usina de cana-de-açúcar Debrasa, unidade da Companhia Brasileira de Açúcar e Álcool (CBAA), pertencente ao grupo, em Brasilândia (MS).

Entre os dias 03 e 14 de junho de 2008, 55 trabalhadores foram resgatados no município de Icém (SP) na Usina Agrisul. A usina faz parte da CBAA. O Ministério do Trabalho e Emprego constatou servidão por dívida. Diligência autorizada pela Justiça encontrou documentos pessoais de trabalhadores que atuavam na Agrisul retidos numa mercearia da região. De acordo com o governo, o grupo resgatado foi vítima de aliciamento ilegal por empresas terceirizadas. Foram transportados de forma clandestina do Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais, para as proximidades da usina. No início da empreitada, conforme relatos obtidos pela fiscalização, foram submetidos a condições degradantes: dormiram no chão e passaram fome.

Por causa disso, ele teve que sair do Conselho do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e expulso do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, que congrega 20% do PIB empresarial brasileiro no combate a esse crime.

Tanto fez, que o Grupo José Pessoa entrou na "lista suja" do trabalho escravo, através da Agrisul. Os bancos públicos federais e as empresas signatárias do Pacto Nacional cortam relacionamento financeiro e comercial com os empregadores relacionados nesse cadastro do governo federal.

Então, quando tudo o que podia acontecer já parecia ter acontecido, eis que chegou às minhas mãos uma carta, divulgada ontem pelo Comitê Popular de Erradicação do Trabalho Escravo do Norte Fluminense, em Campos (RJ). Denuncia ao poder público que cerca de 240 empregados da usina Santa Cruz, pertencente ao Grupo J.Pessoa, paralizaram suas atividades ontem para protestar por supostos direitos trabalhistas devidos pelo empresa.

É por essas e por outras que existe aquela proposta tramitando no Congresso Nacional, que prevê o confisco de terras em que trabalho escravo for encontrado. E que está parada por força da bancada ruralista e falta de empenho de grande parte dos senhores deputados.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.