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Leonardo Sakamoto

Dicas de pensamento para Homer Simpson

Leonardo Sakamoto

24/09/2008 17h25

Washington – No começo, achei que era piada. Mas depois me disseram que não.

As estações de metrô da cidade são um campo de batalha de grupos lobistas em busca de apoio ou justificando suas ações. Uma vez que quase todo mundo passa pelo metrô, inclusive os formadores de opinião, tomadores de decisões e construtores de políticas públicas, é um local perfeito para guerrear por corações e mentes.

Pessoas, grupos e instituições têm o direito de expor suas idéias e tentar convencer os demais a adotar os mesmos ideais. Mas quando você vê peças publicitárias apelando, distorcendo, acochambrando, simplificando a ponto de virar má fé para tentar conquistar o transeunte, dá tristeza. E o resultado consegue ser pior do que aqueles comerciais bizarros da associação de emissoras de rádio e TV no Brasil dizendo que as rádios comunitárias interferem na comunicação de aviões.

Um amigo que mora aqui na cidade diz que ele mesmo se surpreendeu com as placas no metrô. Sobre o nível da publicidade e a resposta do público sobre elas, suspira: "O cidadão médio americano está emburrecendo…"

Tirei fotos de algumas para vocês terem uma idéia:

Tentando convencer a sociedade que a bebida não provoca tantos acidentes de carro:

"Você pensa que sabe qual a maior ameaça à segurança no tráfego?", pergunta o cartaz. Ele mostra um graficozinho picareta com uma curva ascendente de acidentes "sem álcool" e uma vida descendente de acidente com álcool. Depois afirma que a distração ao voltante e alta velocidade podem ser mais perigosas que o álcool. E pede para o leitor pensar de novo.

Picareta porque o gráfico não diz nada. Se houve uma redução no número de acidentes com pessoas alcoolizadas devido a um endurecimento da lei (aqui, dirigir bêbado dá cana – sem trocadilhos), é claro que haverá diminuição proporcional. Ou seja, menos gente morrendo de um jeito vai aumentar a porcentagem da outra forma de morrer. Outra: cadê a fonte da informação? Qualquer Zé Mané pode ter inventado os dados. E, por fim, um cartaz que defenda beber e dirigir é o fim da picada! Você pode questionar a rigidez de determinadas legislações, mas creio que só os babacas – e algumas empresas que lucram com isso – defendem que se possa dirigir bêbado.

Seguem outros exemplos:

Defendendo o direito de usar animais em testes de laboratório, prática que vem sendo contestada cada vez mais por grupos de médicos e da sociedade civil:

Tentando jogar os empregados contra os sindicatos que os representam, afirmando que não existe mais a polarização sindicatos/empregadores e sim sindicatos/empregados:

Defendendo o direito de se entupir de porcaria até morrer:

Sobre a ação do lobby nos Estados Unidos sugiro a comédia "Obrigado por fumar", filme de Jason Reitman, baseado em livro de Christopher Buckley.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.