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Leonardo Sakamoto

E 4270 empregos se foram pelos ares

Leonardo Sakamoto

19/02/2009 19h28

A Embraer, terceira maior fabricantes de jatos do mundo, anunciou hoje que vai dispensar cerca de 4,27 mil empregados – 20% dos seus quadros.

Ao ver essa notícia, a impressão é de que os pedidos nacionais e internacionais de aeronaves desapareceram como em um passe de mágica: Puf!  Afinal de contas, uma empresa que ganhou (e cresceu) muito nos últimos anos e que estaria capitalizada para enfrentar fortes turbulências – sem trocadilho – certamente viu o abismo de perto para tomar medida tão drástica.

Contudo, mesmo sendo uma empresa eminentemente exportadora (e, lá fora, a situação está realmente mais feia), a empresa diminuiu em apenas 10% a previsão de entregas neste ano (de 270 para 242 aeronaves) com uma  queda de receita prevista em 13% (de 6,3 para 5,5 bilhões de dólares) – dados do Valor Online e da Folha Online. A empresa fechou o ano com uma carteira de pedidos firmes de 20,9 bilhões de dólares, tendo entregue 204 aviões em 2008. Ou seja, não tinha como encontrar outra possibilidade para manter os trabalhadores?

"A Embraer expressa seu profundo respeito às pessoas que ora deixam suas posições na Empresa. Respeito pelo trabalho que desenvolveram, pelo tempo de convívio profissional e pessoal, pelo momento difícil que atravessam." Eu adoro esses trechos de notas que tentam dourar a pílula. "Deixar posições"? Como diria o articulista José Simão, tucanaram o "pé na bunda"! Se era para ter dito isso, melhor não dizer nada.

Este momento de crise econômica global é uma ótima justificativa para acertar o custo trabalho em muitas empresas que avançaram tecnologicamente e, agora, querem dispensar mão-de-obra. Presidentes e CEOs (ou assessorias de imprensa, no caso dos mais envergonhados) vêm a público dizer que isso vai garantir a manutenção da "competitividade" nos negócios (e consequentemente, lucro). Não falam, contudo, que isso ocorrerá em detrimento à qualidade de vida dos trabalhadores que tornaram a capitalização possível.

Neste momento, os balanços econômicos de muitas grandes empresas mostram que não há necessidade real de se aplicar um remédio tão amargo, uma vez que várias delas ganharam muito nos últimos tempos. Mesmo assim, tentam mostrar a necessidade de um remédio amargo. Chegou-se a discutir no Congresso Nacional – como ocorre na Europa – redução de jornada, com manutenção de salário, mas a proposta causa arrepios em muitos empresários.

O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos diz que a Embraer teve acesso a 7 bilhões de dólares de financiamento do BNDES (dinheiro público, meu, seu, nosso, dos trabalhadores em geral) desde que foi privatizada em 1994. O que só aumenta a necessidade de debater e implementar contrapartidas à concessão de crédito público que garantam manutenção de empregos. É importante ressaltar que a empresa nem chegou a negociar com os seus empregados.

Governo, sindicatos e trabalhadores devem ficar atentos. Há empresas que passarão por sérias dificuldades e para garantir empregos negociações serão necessárias, dentro é claro de marcos legais. Mas, olhando a experiência de outras crise, é possível prever que parte dessas reduções tendem a se cristalizar quando a tempestade passar, aumentando o subemprego e mantendo os ganhos empresariais intocados.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.