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Leonardo Sakamoto

Bento 16 na Jordânia e um belo apê no Rio de Janeiro

Leonardo Sakamoto

09/05/2009 22h00

Em visita hoje à Jordânia, Bento 16 afirmou que "muitas vezes a manipulação ideológica da religião, às vezes com fins políticos, é o verdadeiro catalisador de tensões e de divisões. E, às vezes, inclusive de violências na sociedade".

Se não viesse da boca de um sumo pontífice, eu diria que isso é uma crítica sobre a histórica relação promíscua entre o cristianismo e o poder. Afinal de contas, desde a "conversão" do imperador romano Constantino, passando por reinos e impérios tementes ao Vaticano na Idade Média, pela inação de Pio 12 durante o nazismo e a ação de João Paulo 2º contra o socialismo, a manipulação ideológica da religião tem sido instrumento muito útil para a própria igreja. Não só a Católica.

Os verdadeiros catalisadores de tensões sociais são coisas mais terrenas como pobreza, injustiça social, fome. Se quisesse mesmo contribuir nesse campo, a Igreja Católica poderia começar distribuindo suas terras (que são muitas) e contribuindo para uma reforma agrária na periferia do mundo. Não vai resolver, mas pelo menos teríamos um pouco mais de coerência – valor tão vilipendiado nos dias de hoje.

E olha que nem estou sugerindo diminuir o luxo sob o qual vivem determinados "representantes" de Deus na Terra. Como é o caso do apartamento de R$ 2,2 milhões, 500 metros quadrados e condomínio de R$ 2 mil mensais que foi comprado pela Arquidiocese do Rio de Janeiro para abrigar o ex-arcebispo Eusébio Scheid quando estiver na cidade.

Se vivesse hoje, aquele filho de Belém nasceria em um apê como esse na Zona Sul do Rio ou na Rocinha?

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.