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Leonardo Sakamoto

Piauí deve retirar símbolo religioso de repartição pública

Leonardo Sakamoto

03/07/2009 21h43

O Ministério Público do Piauí solicitou a retirada de símbolos religiosos dos prédios públicos no Estado, atendendo a uma representação feita por 14 entidades da sociedade civil. O promotor Edílson Farias, que está tratando do caso, deve propor um Termo de Ajustamento de Conduta para que os governos municipal, estadual e federal retirem imagens e fechem capelas dentro de edifícios públicos. Caso não façam isso, provavelmente serão alvo de um ação civil, baseada no inciso I do artigo 19 da Constituição, que diz ser proibido ao poder público estabelecer cultos religiosos ou igrejas.

É claro que setores não-progressistas da Igreja Católica no Piauí chiaram na audiência realizada, nesta semana, em Teresina para discutir o assunto.

Com isso, o Piauí – sempre vítima de preconceito – dá, ao resto do país, uma aula de cidadania e de respeito à separação entre Estado e religião.

No início do ano, o presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro Luiz Sveiter mandou retirar os crucifixos que adornavam o prédio e converteu a capela católica em local ecumênico. Ou seja, não fez mais do que se espera de uma autoridade pública em um governo que deveria ser laico, acolhendo todas as crenças e denominações religiosas, mas sem discriminar nenhuma delas.

Mas ele enfrentou contestações tanto por seus colegas desembargadores quanto por parte da sociedade, que defenderam a permanência do crucifixo por motivos religiosos ou por tradição.

Tradição, sabe? Aquela coisa do "Ué! Mas sempre foi assim, por que mudar?", a que sempre se recorre quando se confronta algo do passado, nem sempre justo, com um argumento racional.

É necessário que se retirem adornos e referência religiosas de edifícios públicos, como o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional. Não é porque o país tem uma maioria de católicos que espíritas, judeus, muçulmanos, enfim, minorias, precisem engolir um símbolo cristão. Além disso, as denominações cristãs são parte interessada em várias polêmicas judiciais – de pesquisas com célula-tronco ao direito ao aborto. Se esses elementos estão escancaradamente presentes nos locais onde são tomadas as decisões sem que ninguém se mexa para retirá-las, como garantir que as decisões serão isentas?

Por fim, o Estado deve garantir que todas as religiões tenham liberdade para exercer seus cultos. Mas não pode se envolver, positiva ou negativamente, em nenhuma delas. Estado é estado. Religião é religião.

É simbólico. E, por isso, imprescindível.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.