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Leonardo Sakamoto

Governo federal atualiza "lista suja" do trabalho escravo

Leonardo Sakamoto

21/07/2009 14h57

Ao todo, 17 empregadores (13 pela primeira vez e quatro após as liminares que os mantinham fora serem suspensas) foram inseridos no cadastro do governo federal dos que utilizaram mão-de-obra escrava. Outros 34 em definitivo saíram após cumprir dois anos na lista e quitar suas pendências com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e um saiu temporariamente após obter liminar judicial. A atualização foi divulgada nesta terça (21).

A "lista suja" tem sido um dos principais instrumentos no combate a esse crime, possibilitando a ação da opinião pública e de atores econômicos. Quem é nela incluído pelo MTE, fica sem acesso a financiamentos públicos e é submetido a restrições comerciais por empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. O nome de uma pessoa física ou jurídica só é incluído na relação depois de concluído o processo administrativo referente à fiscalização dos auditores do governo federal e lá permanece por, pelo menos, dois anos – mesmo que a situação que gerou o problema tenha se resolvido no dia seguinte. Dessa forma, garante-se que as mudanças não serão meramente cosméticas, mas consistentes. Durante esse período, o empregador deve garantir que regularizou os problemas e quitou suas pendências com o governo e os trabalhadores. Por isso, passa por monitoramento direto e indireto. Caso contrário, permanece na relação.

Quatro empregadores também foram reinseridos após as liminares que haviam obtido na Justiça para ficar fora da "lista suja" terem sido suspensas. Devido ao impacto econômico gerado pela perda de créditos e de clientes desde que a lista foi implantada em 2003, empregadores inseridos no cadastro da escravidão tem procurado a Justiça para obterem o direito de sair e poderem continuar seus negócios – mesmo sem aquela mudança consistente ter ocorrido. Para garantir que esses nomes voltem à lista, o Ministério do Trabalho e Emprego e a Advocacia Geral da União têm atuado conjuntamente para obter a cassação das liminares com sucesso.

Com a atualização, a "lista suja" conta com 175 pessoas físicas e jurídicas. Boa parte dos novos nomes são grandes proprietários rurais.

A fazenda e usina Debrasa, da Agrisul Agrícola Ltda, no Mato Grosso do Sul, pertencente ao Grupo José Pessoa retorna à relação. E, junto com a Agropecuária Serra Grande Ltda (Agrosserra), no Maranhão, que volta após a liminar judicial que a mantinha fora perder efeito, engrossam o grupo de empresas do setor sucroalcooleiro já presente na "lista suja".

Rosana Sorge Xavier entrou por conta da escravização de 16 trabalhadores rurais na fazenda Santa Luzia, voltada à criação de gado para corte. Essa propriedade já havia passado pela "lista suja", anos atrás, quando estava sob a responsabilidade de outra pessoa da mesma família: Sebastião Douglas Xavier. Os Xavier são proprietários do frigorífico Quatro Marcos, grupo envolvido com denúncias de crimes ambientais e trabalhistas, que está em recuperação judicial. Por exemplo, a unidade localizada em Juara, no bioma amazônico, teve suas atividades embargadas pelo Ibama em junho de 2008 por operar sem licença ambiental. A empresa também foi acionada pelo Ministério Público por descartar os resíduos orgânicos de forma irregular e sem tratamento em áreas de preservação. A unidade de Juara foi assumida pelo frigorífico JBS Friboi recentemente.

Uma informação importante: quando o governo federal divulgou a relação com os 100 maiores desmatadores da Amazônia, Rosana estava em nono lugar.

Vitalmiro Bastos de Moura, acusado de ser um dos mandantes do assassinato da irmã Dorothy Stang, em Anapu (PA), em 2005, foi um dos que saíram da lista nesta atualização após cumprir as regras de entrada e saída da "lista suja".

Caso a proposta de emenda constitucional 438/2001, a chamada PEC do Trabalho Escravo (que prevê o confisco das terras em que escravos forem encontrados), já estivesse em vigor, empregadores como ele poderiam perder a fazenda. A proposta está parada no Congresso Nacional, em grande parte por conta da pressão da bancada ruralista.

Sugiro a matéria da Repórter Brasil sobre o assunto, bem mais completa que este post, que será publicada em breve.

Para ver a lista suja, clique aqui.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.