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Leonardo Sakamoto

Nem PT, nem PSDB. No ano de eleição, o DEM é a estrela

Leonardo Sakamoto

22/02/2010 12h57

Retomando algo que já havia escrito aqui antes, porque está mais atual do que nunca. Creio que a tendência no Brasil é a do afunilamento do número de partidos relevantes a quatro ou cinco, tal como muitas democracias européias. Os menores continuariam existindo, mas sempre gravitando em torno desses para fazer contrapeso – ideológico, programático ou fisiológico. Há quem defenda que teremos apenas dois ou três grandes, mantendo os demais dentro do jogo, mas com uma importância restrita, como nos Estados Unidos ou na Inglaterra. Hoje, o mais lógico seria falar de uma polarização PT/PSDB, com o PMDB balançando a sabor do vento. Mas fico imaginando que, se adotássemos o voto distrital, talvez a polarização fosse PT/PMDB pela capilaridade de ambos, ainda que este último não seja um partido, mas uma coisa amorfa, um catadão de interesses, muitas vezes individuais.

Como agrupamento político que manteria a relevância, sempre colocavam o DEM, ex-PFL, ex-Arena, que sobreviveria por ser um partido com uma bandeira ideológica (conservadora) bem delimitada e, portanto, com um público a representar. Por exemplo, há deputados e senadores, críticos do sistema de combate à escravidão contemporânea no Brasil, que já receberam apoio de fazendeiro flagrado cometendo o crime. Na minha opinião, eles não receberam o apoio PARA defender essa bandeira mas POR defender essa bandeira, entre outras. O resultado poder ser o mesmo, mas é uma grande diferença.

De qualquer forma, esse antigo naco de sustentação da ditadura militar foi minguando, minguando, diminuindo em importância em eleitos no Executivo. E se não se agarrasse com todas as forças ao PSDB, hoje seria praticamente nada. Ou alguém acha que, sem a ajuda do seu padrinho José Serra, Kassab teria sido eleito prefeito de São Paulo?

Hoje, seu único governador, José Roberto Arruda (DF), foi preso tempos depois de aparecer em um vídeo recebendo pacote de dinheiro. Justifica que o objetivo era fazer a alegria dos pobres sem-panetone. Segundo a Polícia Federal, os recursos serviriam para pagar uma espécie de "mensalão do DEM", primo daqueles do PT e do PSDB. O interino, que também é do DEM, pode renunciar ao cargo para preservar seus negócios.

Em São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab acaba de ser cassado por ter supostamente recebido doações ilegais para a campanha eleitoral de 2008. Totalizariam um terço dos recursos arrecadados. A defesa vai recorrer, o que deve mantê-lo no cargo até uma decisão final. Mas os cardeais do partido já se anteciparam e saíram em sua defesa. Parte deles foi pela linha do problema técnico a ser resolvido, uma vez que as contas já teriam sido aprovadas. Outro grupo afirma que a decisão é eleitoral, irresponsável, criminosa, entre outros adjetivos sempre usados nessas horas. Dizem que tudo isso serve para desestabilizar o governador Serra.

Temos visto alguns formadores de opinião desesperados, que saem a público sem os devidos pudores e dão dicas ao DEM: olhe, não ataque o governador Serra; não deixe a periferia alagar em época de chuva; não aumente os impostos em São Paulo; não defenda o desmatamento tão perto da Cúpula de Copenhague; não critique desoneração tributária em móveis e eletrodomésticos, chamando sofá e geladeira de artigos de luxo, porque isso pega mal na véspera de eleição; cuidado com a demofobia; troque o coronelismo por uma outra forma de política… Mas como nem todo mundo ouve, vira e mexe aparece um parlamentar atirando a esmo ou fazendo besteira. No final, o ato impensado fica registrado como mais uma tentativa de suicídio de um partido que trocou de nome mas não conseguiu se adaptar aos novos tempos.

A agonia pública de um partido deveria ser chorada pela perda de pluralidade política em uma democracia. Mas, tendo em vista a sua longa lista de serviços prestados à nação, não consigo derramar uma só gota.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.