O brasileiro fala a verdade sobre si mesmo?
Esta semana, abordado na rua, respondi a uma pesquisa de opinião. Ao final, quando a entrevistadora questionou minha profissão, não gostou do que ouviu, fechou a cara, depois a prancheta, agradeceu amarelamente e escafedeu-se. Eu sei, dei mancada, devia ter dito antes quem eu era. Raramente jornalistas podem ser ouvidos nessas pesquisas. Sendo honesto, não sei bem o motivo, mas desconfio que seja porque há o medo de que manipulemos o resultado. Ou não sejamos um público consumidor confiável. Ou que saibamos como funciona uma entrevista e possamos jogar com o entrevistador. Sei lá.
Acumulo histórias ouvidas ou vividas em anos de estrada: a do escravo liberto que inventou mulher e filhos para ganhar empatia, a do chefe indígena ambientalista radical (que depois descobriu-se ser um grande vendedor de madeira ilegal), a do catador de material reciclável que narrou uma trajetória pessoal surrealista só para ajudar o pobre repórter iniciante que estava com uma pauta-pepino nas mãos. Como, muitas vezes, a velocidade na linha de produção da imprensa dificulta aos operários da notícia irem fundo nas biografias daqueles que entrevistam, o que fica é essa superficial conversa, muitas vezes construída sem o propósito de enganar. Apenas de tornar a vida mais interessante e palatável! É papel de um entrevistador profissional perceber isso, mas somos humanos e, portanto, erramos. Bastante.
Tenho a impressão que, com pesquisas de opinião, ocorre a mesma coisa. Muitos respondem o que é mais socialmente aceito ou politicamente mais correto. Mas, na hora "H", optam pela saída mais confortável individualmente.
É hype defender o verde e o consumo consciente. Mas no momento sigiloso da caixa registradora, a sustentabilidade é defenestrada sem cerimônia. Poucos se aventuram no preconceito aberto contra os gays quando podem ser visto pela sociedade, mas no anonimato dos comentários em um blog na internet, a intolerância se esbalda e se espreguiça. Em todas as pesquisas de opinião sobre racismo, os entrevistados dizem que não têm preconceito por cor de pele, mas que os outros brasileiros sim.
Uns vão dizer que é medo, outros hiprocrisia. A verdade é que é mais fácil continuar enganando incautos mocinhos e mocinhas entrevistadores de prancheta na mão do que encarar a verdade sobre nós mesmos.
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