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Leonardo Sakamoto

Usinas com irregularidades exportam para EUA e Europa

Leonardo Sakamoto

25/05/2011 13h11

A criação de mecanismos de monitoramento da produção sustentável de etanol pelos setores público e privado nos Estados Unidos e na Europa não estão impedindo usinas brasileiras flagradas com irregularidades trabalhistas e ambientais de exportarem o combustível.

Isso é o que aponta um estudo divulgado ontem pelo Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis, aqui da Repórter Brasil. "O etanol brasileiro no mundo – os impactos socioambientais causados por usinas exportadoras" cruzou informações sobre autuações trabalhistas e ambientais emitidas por órgãos oficiais com dados sobre grupos exportadores. Detectou, dessa forma, que várias deles estão presentes nas duas listas e, apesar disso, têm exportado etanol para países que já contam com legislações que pedem monitoramento socioambiental de importações.

O estudo relata as irregularidades socioambientais, bem como os destinos das exportações, de grupos como Cosan, Greenergy International, São Martinho, Louis Dreyfus Commodities, Carlos Lyra, Copertrading, Moema/ Bunge e Noble. Há casos registrados de trabalho escravo, excesso de jornada de trabalho, falta de registro em carteira, despejo irregular de resíduos, queimadas não permitidas e uso de terra indígena para produção de cana nos últimos anos.

Ou seja, impactos negativos sobre o povo brasileiro e nosso meio ambiente.

Entre 2009 e 2010, foram registradas exportações de etanol por mais de 40 empreendimentos instalados no Brasil, entre usinas, cooperativas ou empresas especializadas em comércio internacional. Em número de fornecedores, a Europa foi o principal destino do etanol brasileiro, com destaque para a Holanda (23 fornecedores), Inglaterra (14), e Suíça (9). Os demais clientes de peso do combustível brasileiro foram EUA (14), Japão (13) e Índia (8).

As exportações brasileiras de etanol caíram 42,4%, para 1,5 milhão de toneladas em 2010. O recuo é justificado por um conjunto de motivos, como a redução da disponibilidade do produto para exportação, causada pelo aumento do consumo de etanol no mercado interno e o maior uso da cana para fabricação de açúcar, além dos persistentes efeitos da crise financeira internacional nos Estados Unidos e na Europa, que contiveram a demanda por combustíveis importados.

O governo e o setor privado brasileiro, porém, avaliam que a queda é conjuntural e apostam que o país pode se tornar um importante exportador a médio prazo. É essa expectativa tem incentivado governos estrangeiros e segmentos do setor privado a avançarem na criação de padrões de sustentabilidade para a importação de combustíveis renováveis, entre eles o etanol brasileiro.

Os Estados Unidos, por exemplo, maiores consumidores de energia renovável do mundo, exigem que as usinas cadastrem-se na Agência de Proteção Ambiental norte-americana em troca da redução das burocracias de exportação. É um procedimento simples, que pode ser realizado pela internet e que exige um relatório assinado por um profissional independente com detalhes sobre o parque produtivo da usina. Há pouca chance de que uma delas tenha seu cadastro negado, uma vez que a EPA já classificou o etanol de cana-de-açúcar como uma variedade de baixo carbono avançada.

No caso da União Européia, a principal peça normativa sobre combustíveis renováveis foi lançada em maio de 2009 e é chamada Diretiva 2009/28/CE. Ela determina que, até 2020, o bloco alcance uma cota de 20% de energias renováveis no consumo final bruto de energia e cada país-membro atinja a meta mínima de uso de 10% de energia renovável no setor de transportes.

Para dirimir problemas socioambientais, a diretiva determina uma série de critérios de sustentabilidade para a produção de biocombustíveis. Esses critérios devem ser seguidos da mesma maneira por fornecedores de dentro ou de fora do bloco. Isso significa que uma usina sucroalcooleira do Brasil deve cumprir os mesmos requisitos de sustentabilidade exigidos de uma companhia instalada na União Européia. Mas todos esses procedimentos ainda dependem de uma fase de regulamentação na própria União Européia e nos Estados nacionais que compõem o bloco.

Para baicar o relatório, clique aqui.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.