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Leonardo Sakamoto

PSDB quer ser o pai que fica com parte "boa" e deixa fralda suja para Temer

Leonardo Sakamoto

12/06/2017 13h16

Sabe aquela história do pai que leva as filhas para o estádio de futebol, joga videogame com elas ou as ensinar a empinar pipa, mas nunca trocou uma mísera fralda de bunda suja ou acordou de madrugada para ver o que o choro do quarto ao lado significa sem que a mãe precisasse "pedir ajuda"? Parece que o PSDB quer encarnar a figura de pai picareta que só fica com a parte suave se as coisas complicarem com o governo Temer.

Muitos tucanos defendem que, se for para sair do governo, o partido deve continuar apoiando as Reformas Trabalhista e da Previdência. Dizem, de forma cínica, que isso será "em nome do país" quando sabem que seria em nome do grande empresariado e do mercado. Claro que não podem falar a verdade porque a esmagadora maioria da população é contra. Não das reformas em si, pois sabem da necessidade de atualizar as regras do país, mas do seu formato, imposto de um jeito violento e antidemocrático pelo governo do qual o partido faz parte.

Há, pelo menos, três grupos de tucanos: os que querem ficar com Temer e apoiar as reformas, os que não querem ficar com Temer e apoiar as reformas e os que não querem ficar com Temer, nem apoiar as reformas. Só para deixar claro: este último, que se preocupa com a raiz social-democrata do partido, é minoria.

Afinal, se as Reformas Trabalhista e da Previdência não passarem até o ano que vem, candidatos do partido podem ser execrados em debates na TV ao ter que defendê-las como uma de suas propostas de um futuro governo. E nem horas de discurso antipetista ou a ajuda de influenciadores digitais e seus perfis falsos que distribuem notícias mais falsas ainda vão salvar uma debandada do eleitorado ao perceber que um candidato apoia uma redução dos direitos dos trabalhadores da ativa e dos aposentados.

Temer não tem muitas opções hoje, a bem da verdade. Com a corda no pescoço, depende do apoio do PSDB e do empresariado que o partido representa. E sabe que sua melhor chance é tanto mostrar-se capaz de entregar essas encomendas corporativas quanto a falta de consenso de quem o substitua na tarefa no curto prazo. Se tivesse apreço à dignidade, afirmaria publicamente que um desembarque do PSDB levaria ao congelamento das reformas – o que deve estar sendo colocado em bastidores. Aliás, se tivesse dignidade, renunciaria e articularia eleições diretas para a sua vaga. Mas isso é outra história, porque a questão agora não é de garantir sua própria liberdade.

(Romero Jucá demonstrou mais autoestima ao afirmar que vai ser muito difícil o PMDB apoiar os tucanos nas eleições do ano que vem se estes vazarem agora.)

O PT, de certa forma, pagou o preço de ter colocado Michel Temer em nossas vidas com a conspiração a céu aberto realizada pelo então vice visando ao impeachment. Agora, seria justo o PSDB arcar com as consequências. Ao invés de pedir o divórcio e se divertir com as filhotas só nos finais de semana (ou seja, tocar as reformas e, junto aos eleitores, culpar Temer, o Breve), seria melhor que os dois ficassem juntos até o fim se for para mudar as leis trabalhistas e as regras de aposentadoria.

Aliás, que não fique só nisso. O PSDB deveria defender todas as falcatruas dos membros do governo aos microfones da imprensa e votar contra a denúncia que deve ser encaminhada pela Procuradoria Geral da República pedindo o afastamento de Temer. Que tenha a coragem de seguir ao lado de Temer para o bem e para o mal.

E, por favor, tire muitas fotos abraçando-o, bem como a Eliseu Padilha e Moreira Franco. Daquelas para usar em santinhos eleitorais. E faça muitos discursos defendendo Temer, como o inflamado pedido para que o tucanato paulista não desembarcasse do governo realizado pelo prefeito João Doria.

Assim fica mais fácil explicar aos eleitores de 2018 quem foram os responsáveis pela vida deles estar pior.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.