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Leonardo Sakamoto

Cenário provável: Lula deve disputar primeiro turno e sua sombra, o segundo

Leonardo Sakamoto

31/01/2018 10h27

Foto: Douglas Magno/AFP

Em todos os cenários em que aparece como candidato à Presidência da República, Lula segue com, pelo menos, o dobro de votos do segundo colocado, de acordo com a pesquisa Datafolha divulgada nesta quarta (31). É especulação dizer que isso vai se manter ao longo do semestre com as consequências da condenação em segunda instância no último dia 24. Mas, da mesma forma, é especulação afirmar o contrário.

A estratégia provável a ser tomada pelo PT é de seguir com Lula candidato até setembro e decidir a partir das pesquisas de intenção de voto e do avanço ou não das apelações do ex-presidente, como já adiantei neste blog logo após a decisão do Tribunal Regional Federal da 4a Região.

Nesse sentido, um dos dados mais relevantes do Datafolha é que Lula continua sendo o grande eleitor" de outubro. Por mais que essa capacidade tenha se reduzido em relação a novembro, é cedo para dizer que a queda representa uma tendência. Hoje, 27% afirmam que certamente votariam em um candidato apoiado pelo ex-presidente e 17% apontam que talvez fariam isso. Outros 53% rejeitariam esse candidato, o que é um número expressivo, mas contornável às pretensões do PT considerando que parte desses eleitores, na hora H, pode engrossar o caldo da abstenção e dos votos brancos e nulos.

Ao mesmo tempo, pré-candidatos da base aliada do governo federal disputam o direito de representá-la nas eleições. Confiam que a economia crescerá o suficiente para gerar um impacto positivo junto à população. Contudo, uma das principais causas de mudança na aprovação de um governo junto a uma fatia considerável da classe trabalhadora é a geração de empregos. E, apesar dos espasmos positivos, isso ainda patina. Quantitativamente, qualitativamente.

Apesar da queda do desemprego no último trimestre do ano, a taxa média anual do país subiu de 11,5%, em 2016, para 12,7%, em 2017, segundo a PNAD Contínua do IBGE, divulgada também nesta quarta. A informalidade cresceu e o número de pessoas que trabalham por conta própria também.

Isso ajuda a fazer de Michel Temer o cabo eleitoral mais impopular das opções estudadas pelo Datafolha: 87% dos eleitores rejeitam o seu candidato, sejam que for, apenas 4% aceitariam a indicação e 8% avaliaram a possibilidade. Se as taxas de empregos subirem fortemente ou se a taxa de homicídios no país cair do patamar de 60 mil/ano para algo bem menor, Temer vira Midas. Caso contrário, o único benefício de estar sendo abraçado por ele segue sendo o uso da máquina do governo federal em prol de uma candidatura.

Lula, além de uma quantidade consolidada de apoiadores históricos, tem a lembrança do bom momento de emprego em seu governo, que garantiu poder de consumo para a chamada "nova classe média". Poderá tentar convencer o eleitorado, em setembro, a migrar a promessa de retorno aos bons tempos para Fernando Haddad, Jaques Wagner ou outra alternativa no PT ou no campo à esquerda. Resta saber se o PT toparia apoiar um candidato melhor posicionado de outro partido caso as soluções de casa não agradarem o eleitorado. Porque transferência de votos não é ciência exata, nem faz milagres.

Cenários possíveis – Já descrevi aqui quais seriam os possíveis passos adotados pelo PT após a condenação de Lula e acho importante resgata-los. Em 15 de agosto, o partido registra a candidatura do ex-presidente. Ele pode estar preso e condenado, não importa, o protocolo tem que aceitar o registro.

O horário eleitoral em rádio e TV começa no dia 31 de agosto. Vai ser um bombardeio de imagens e declarações de que Lula está preso e/ou condenado porque quis defender o povo. A propaganda tem o objetivo de transformar o mártir e o mito na já citada ideia. Que será exaustivamente utilizada por seu partido político no processo eleitoral.

De acordo com Fernando Neisser, advogado especialista em direito eleitoral e um dos coordenadores da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), o prazo máximo para uma decisão da Justiça Eleitoral para julgamento de registros é 17 de setembro. Na prática, esse é o deadline para substituir candidatos em chapas. Porque, logo em seguida, as urnas são carregadas com as informações de todos os concorrentes.

O julgamento do Tribunal Superior Eleitoral sobre uma possível candidatura Lula, caso seja antecipado, pode ser realizado em algum momento entre 7 e 11 de setembro. A corte estará sendo presidida por Rosa Weber, mas com presença de Luís Roberto Barroso e Edson Fachin – um trio que certamente não será simpático à demanda do ex-presidente. Se Lula não tiver conseguido uma decisão liminar no STF ou STJ que suspenda a condenação criminal, o TSE vai negar a ele o registro.

Ele pode recorrer ao próprio TSE com embargos de declaração. Depois disso há uma série de meandros jurídicos para fazer subir um recurso extraordinário ao Supremo, que não seria julgado em definitivo antes do final do segundo turno. Daí, Lula e o PT têm duas opções: transfere votos par alguém que fez campanha ao seu lado e a colocam em seu lugar para disputar o primeiro turno ou continuam apostando em Lula.

Se a primeira opção for a escolhida, é provável que ele consiga empurrar seu candidato ou candidata ao segundo turno transferindo os votos. Afinal, o tempo é curto e a comoção será grande. Seu apoio ainda vai contar pontos, mas daí o novo candidato estará por conta própria – podendo inclusive perder.

De qualquer forma, terá cumprido outra função importante: ajudar o PT a garantir sua bancada no Congresso Nacional. Sem um nome forte puxando votos, haverá uma óbvia redução do número de cadeiras do partido como resultado das denúncias de corrupção.

Se a segunda opção for a escolhida, a partir da abertura das urnas na noite do primeiro turno, no dia 7 de outubro, Lula aparecerá com zero votos pois teve a candidatura negada pelo TSE, mesmo com o recurso extraordinário em trâmite. O TSE até pode autorizar que ele dispute o segundo turno sob a justificativa de que está recorrendo, como já aconteceu em algumas cidades. Mas essa decisão não está clara na lei. Portanto, mesmo com o recurso, o TSE pode não colocá-lo no segundo turno. Ou seja, é um tiro que pode dar na água.

E se sua presença no segundo turno for negada, passam os outros dois mais votados. Caso participe do segundo turno e perca para Geraldo Alckmin, Luciano Huck, Jair Bolsonaro, Marina Silva ou alguém como J.Pinto Fernandes, que não estava na história, acabou.

Se tiver conseguido uma (difícil) liminar que suspenda a condenação, ganhar a eleição e, antes da posse, o pleno do STF confirmar a decisão de segunda instância, novas eleições são convocadas. O mandato não é do segundo colocado automaticamente. Nesse caso, começamos tudo de novo, com eleições em dois turnos para presidente. Se ganhar e tiver conseguido uma (difícil) liminar que suspende sua condenação criminal ou tiver sido absolvido por um tribunal superior até lá, daí ele vai ser empossado. Caso tenha obtido apenas a liminar, ele toma posse e seu processo congela até o final de seu mandato.

Mas ainda estamos no final de janeiro. A distância daqui até outubro será mais longo que um século.

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.