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Leonardo Sakamoto

Reforma Sindical teria reduzido balcão de negócio no Ministério do Trabalho

Leonardo Sakamoto

06/07/2018 03h52

Michel Temer e o ministro do Trabalho interino, Eliseu Padilha. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Antes de uma Reforma Trabalhista, o Brasil deveria ter feito uma Reforma Sindical. Mas isso não interessa ao sistema político cartorial brasileiro, que loteia as instituições e abre guichês para vender facilidades e privilégios. E, claro, também não é vantagem para uma parte do poder econômico que surfa na estrutura atual, mantendo em sua órbita sindicatos fracos subjugados ou corruptos.

A Operação Registro Espúrio, que investiga um esquema de venda de concessões de registros sindicais, é também fruto dessa situação. O procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Fleury, já pediu uma análise para saber se há instituições sem representatividade que se beneficiaram e poderiam ter o registro cassado. Por que, para gente inescrupulosa, abrir um sindicato ou expandir sua área de atuação, vendendo "tranquilidade" a empresários, é um bom negócio.

Durante o insuficiente tempo de discussão da Reforma Trabalhista, a questão sindical ficou restrita ao superficial debate sobre o fim da obrigatoriedade de que empregados paguem um dia de trabalho ao ano para o sindicato que os representam.

Sempre defendi neste espaço o fim dessa cobrança – mesma posição de diversos sindicatos sérios há décadas. O ideal, contudo, seria um período mais longo de transição para que os sindicatos mais fracos se reorganizassem.

Mas o pacote de mudanças não poderia ter parado por aí e incluído o fim da unicidade sindical, via emenda à Constituição Federal. Ou seja, chega de apenas um sindicato representando uma categoria por região. Afinal, o trabalhador tem o direito de escolher quem o represente. Basta de apoiar sindicatos de fachada montados para que alguns ganhem dinheiro e patrões se divirtam – muitos deles registrados de forma espúria. Dessa forma, sindicatos podem concorrer entre si pelo privilégio de representar os trabalhadores, mostrando o seu diferencial. Isso reduziria o número de sindicatos e os fortaleceria.

Negociações coletivas deveriam envolver os representantes de empregados e empregadores de todas as atividades de uma mesma cadeia de valor. E as conquistas obtidas pelos empregados diretamente contratados também valeriam sempre para os das empresas terceirizadas ou de seus fornecedores. Isso desestimularia a terceirização com o objetivo de ganhar competitividade baseado na superexploração de determinados grupos de trabalhadores.

E aproveitando essa Reforma Sindical, poderíamos também acabar com a contribuição obrigatória de bilhões para o sistema S. As associações empresariais defenderam o fim do imposto sindical porque a queda em sua arrecadação decorrente disso não foi expressiva. Afinal, a maior arrecadação das associações é através da contribuição obrigatória para o sistema S, que é de onde tiram seu poder de influência. Senac, Sesc, Senai e Sesi fazem um excelente trabalho, que deve continuar. Mas essa contribuição também deveria ser voluntária, além de mais transparente. Porque é usada para o que não deveria.

Acredito que devemos incentivar as negociações entre empregados e empregadores sim e que o resultado delas possa prevalecer. Mas o projeto de Reforma Trabalhista proposto pelo governo Temer quis ampliar isso sem garantir que os dois lados estivessem em pé de igualdade. Em muitas categorias, com sindicatos fracos ou corruptos, será um massacre.

Para evitar isso e fomentar a livre negociação, precisamos ter duas coisas: primeiro, um patamar mínimo de regras, definido em lei, para garantir a saúde, a segurança e a dignidade do trabalhador. E, para chegarmos a esse patamar mínimo, uma grande discussão pública seria necessária, ao contrário de passar um rolo compressor em favor dos grandes empregadores.

Segundo, temos que criar processos para fortalecer os bons sindicatos. Por isso, a meu ver, Reformas Sindical e Tributária deveriam preceder as Reformas Trabalhista e da Previdência.

Mas parte da população destila um ódio tão grande pelos sindicatos que é incapaz de entender que o sistema sindical precisa mudar, não desaparecer. Não raro, são trabalhadores que acreditam que a solução é confiar cegamente no patrão, porque ele é bem sucedido, então sabe o que faz.

Isso não funcionou muito bem entre a galinha e a raposa. Mas quem se importa?

Sobre o Autor

É jornalista e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo. Cobriu conflitos armados em diversos países e violações aos direitos humanos em todos os estados brasileiros. Professor de Jornalismo na PUC-SP, foi pesquisador visitante do Departamento de Política da New School, em Nova York (2015-2016), e professor de Jornalismo na ECA-USP (2000-2002). É diretor da ONG Repórter Brasil, conselheiro do Fundo das Nações Unidas para Formas Contemporâneas de Escravidão e comissário da Liechtenstein Initiative - Comissão Global do Setor Financeiro contra a Escravidão Moderna e o Tráfico de Seres Humanos. É autor de "Pequenos Contos Para Começar o Dia" (2012), "O que Aprendi Sendo Xingado na Internet" (2016), entre outros.